Programação

  • 21 de março de 2015 (sábado, das 9h às 17h)

    Aula 1
    1. Christopher Small
    2. Molitsas (pp.38-45)
    3. William Weber (in Cook/Everist)
    4. Didier Francfort (Gand): clique aqui
    5. Circulação da música europeia no Brasil: Texto 1 (História e-história); 
    6. Texto 2 (ANPPOM 2014)

    Sobre o e-mail da Juliane:

    1) Sobre a contribuição de Marlos Nobre, no artigo, quis dizer que o tempero dos trópicos consiste numa contribuição  à linguagem coral europeia. A escrita coral brasileira sem dúvida apresenta traços característicos que não encontramos na tradição coral da europa.

    2) Sobre as "ideias fora de lugar", sustento a ideia de que no Brasil não houve apropriação, mas mera circulação do repertório europeu, transplantado acriticamente, até muito recentemente, se não até hoje. Mesmo em se tratando de índios, negros e mulatos, a ordem era reproduzir o repertório. Mesmo os compositores brasileiros coloniais foram sempre bem-comportados, muito tímidos e subservientes ao estilo da metrópole, como diz Darcy Ribeiro em O povo Brasileiro. No máximo, contribuições individuais. O conceito de apropriação não é simples. Há poucas semanas, pedi orientação sobre esse conceito à minha colega e amiga Rose Hikiji (FFLCH) e ela me mandou algumas pistas que ainda não li mas repasso para quem se interessar:

    Marcos,

    Acho que tem que ver em cada texto como o conceito está sendo mobilizado.

    A crítica da representação em antropologia (que talvez tenha a ver com o que o Cook está dizendo) tem a ver com epistemologia: critica uma forma de pensar a ciência que prevê a possibilidade de um discurso "representar" o mundo, ou alguns de seus aspectos. O texto etnográfico seria uma representação de um contexto estudado, por exemplo. Os críticos desta versão chamam a atenção para o lugar a partir do qual o conhecimento é produzido, e os limites da possibilidade de representar o outro.

    Para tentar te ajudar, busquei na rede e achei este curso oferecido há alguns anos pelo Marco Antonio Gonçalves e a Els Lagrou na UERJ

    http://www.ppgsa.ifcs.ufrj.br/programas/cosmologia-representacao-e-presentificacao-na-teoria-social/

    Das diversas bibliografias, destaco algumas abaixo:

    Gell, Alfred. 1998. "The problem defined: the need for an anthropology of art” e "The theory of the art nexus”. Art and Agency. An Anthropological Theory. Oxford: Clarendon Press. pp. 1-27.

    Gell é um dos autores mais interessantes no campo da antropologia da arte. Achei este trecho do livro acima citado:

    "Enfatizo agência, intenção, causação, resultado e transformação. Eu vejo a arte como um sistema de ação, que visa mudar o mundo, em vez de proposições codificadas simbólicas sobre ele. A abordagem centrada na "ação” é  mais antropológica que a alternativa semiótica porque está preocupada com o papel mediador prático dos objetos artísticos no processo social, em vez de interpretar os objetos como se fossem textos."(6)

    A tradução é minha...

    Arte como sistema de ação (que Gell propõe) se opõe a arte como representação (ou proposições codificadas simbólicas sobre o mundo" / semiótica).

    Um objeto não "representa", "significa", mas é presença, age, na acepção de Gell.

    Vc. acha que isso te ajuda?

    No programa do curso, Marco Antonio e Els citam tb:

    Vernant, Jean-Pierre. 1992. "Figuração e imagem”. In Revista de Antropologia. São Paulo, USP, v. 35. pp. 113-128.

    *1990. "Do duplo à imagem”, in Mito e Pensamento entre os Gregos, 303-330.

    Vernant, neste livro acima, fala da diferença do conceito de DUPLO para o conceito de representação. O duplo, no mundo grego, substitui a pessoa, não a representa.  Vários antropólogos passaram a refletir sobre diferentes sistemas de relação entre objetos e pessoas a partir daí. O objeto (artístico ou não) não necessariamente precisa ser pensado como representação do mundo, mas pode, como entre os gregos, ser o 'duplo' o substituto, o indicador da presença de algo ou alguém. O ex. de Vernant é do Kolossos, uma estátua que indica a presença do morto em uma tumba, por ex. O kolossos não é uma imagem, representação da pessoa. É marca de sua presença.

    Discuti isso no primeiro capítulo do meu livro sobre cinema (imagem-violência). Vou copiar um trecho para vc. abaixo:

    É esse caminho do culto à exposição, do duplo à imagem, que Vernant (1990) traça de outra forma: analisando o exemplo grego. Parte da seguinte pergunta: "como os gregos puderam traduzir na forma visível certas forças do além que pertencem ao domínio do invisível”? (idem:305). Escolhe o exemplo do kolossós, "estátua-pilastra ou estátua-menir, feita de uma pedra erguida, de uma laje plantada no chão, às vezes  mesmo enterrada” (idem:306). Em um cenotáfio do século XIII a.C., o kolossós foi encontrado enterrado em uma tumba vazia, ao lado de objetos pertencentes ao morto, figurando, assim, o cadáver ausente.

    Substituído ao cadáver no fundo da tumba, o kolossós não visa reproduzir os traços do defunto, dar a ilusão de sua aparência física. Não é a imagem do morto que ele encarna e fixa na pedra, é a sua vida no além, esta vida que se opõe à dos vivos, como o mundo da noite ao mundo da luz. O kolossós não é uma imagem: é um "duplo”, como o próprio morto é um duplo do vivo. (idem:306-7; grifo meu).

    O kolossós insere-se pois em uma categoria -- a do duplo -- que implica a compreensão de outra lógica cultural: o duplo não é imagem, imitação de objeto real, ilusão do espírito, criação do pensamento. "O duplo é uma realidade exterior ao sujeito” (idem:309).

    Como o duplo, a própria noção de representação figurada é uma categoria histórica, isto é, nem sempre existiu tal como a conhecemos. Do século XII ao VIII a.C., a Grécia ignora a imagística. É somente entre os séculos V e IV a.C. que primeiro Xenofonte e depois Platão elaboram a teoria da mímesis, especificando o lugar da representação figurada, ao marcar a passagem da "presentificação do invisível à imitação da aparência”. Assim, o símbolo através do qual uma força do além, isto é, um ser fundamentalmente invisível, é atualizada, presentificada neste mundo, transformou-se em uma imagem, produto de uma imitação versada que, pelo seu caráter de técnica erudita e de processo ilusionista, introduz-se desde então na categoria geral do "fictício” -- que nós chamamos de arte. (idem:319)

    A transformação do objeto de culto em objeto de exibição transcorre por meio de modificações na própria arquitetura grega. O ídolo, antes privilégio de uma família, equivalente ao talismã, irá adquirir estatuto de imagem com o surgimento do templo, espaço de "publicidade” (idem:325), no qual a estátua "não tem mais outra realidade senão a sua aparência, não tem mais outra função ritual senão a de ser vista.” (idem, ibidem).

    Outro texto citados por Marco Antonio e Els, mas que não conheço, é:

    Shanon, Benny - The representational and presentational. An essay on cognition and the study of mind. 1993. London, Harvester Wheatsheaf. (cap. 1 Why Representations?. pp.6-19)

    Por fim, achei tb este artigo online, dá uma olhada.

    http://www.scielosp.org/pdf/csp/v9n3/17.pdf

    depois me conta onde vc "chegou" com isso....

    bjs

    Rose

    3) Sobre os critérios para se determinar se uma obra é boa ou ruim, recentemente uma aluna da graduação me fez exatamente esta pergunta. O que repondi foi o seguinte:

    "Oi, Camila, creio que boa música é aquela de que gostamos. Há uma ideologia do cânone que hierarquiza autores e obras, segundo critérios ditos "estéticos" e de valor, mas uma abordagem etnomusicológica considera a música como um evento social compartilhado e nenhum valor estaria atribuído a priori. Por mais que essa visão canônica esteja impregnada no ensino e nas mentalidades, já existem muitos autores que vêm questionando essa visão elitista. Infelizmente, pouca coisa em português, mas em inglês você pode encontrar ótimos textos em Rethinking Music (Nicholas Cook e Mark Everist, Oxford, 1999) e The Cambridge History of Twentieth Century Music (Nicholas Cook e Anthony Pople,  Cambridge, 2004). Envio anexa uma tradução, ainda inacabada, de um artigo de William Weber (in Rethinking Music) e seu original em inglês, que podem te ajudar.  É importante lembrar que a noção de indústria da cultura é um conceito recente e ainda muito mal estudado. Umberto Eco e Edgar Morin, por exemplo, fizeram alguns estudos importantes sobre isso. As primeiras reações foram preconceituosas, mas é preciso pensar que vivemos numa cultura de massa de alto consumo, muito diferente de uma sociedade aristocrática de baixo e restrito consumo. Abraço e boas festas!”.

    4) Sobre o conceito de Arte, sou contra. Creio no ofício e no artesanato que podem ou não produzir aquilo que se acostumou a chamar de "experiência estética”. A propósito disso, Menger (2001, p.337) termina seu livro citando Roger Caillois, poeta francês tradutor de Borges: "...como atividade específica, livre de todo peso funcional (religioso ou social), 'a arte autônoma talvez não terá sido senão um parêntese, uma espécie de moda na história da humanidade' (in Le Monde, 28/11/1975)?'”. Menger conclui: "É no fundo a mesma interrogação que ecoa hoje no debate sobre o princípio de modernidade e seu destino, e que considera a evolução das artes no ocidente desde o romantismo como uma expressão exemplar das contradições ou, para outros, dos recursos da racionalização das atividades humanas em sociedade”.

    Eu creio que o fato estético ("hecho estético”, segundo Borges) não é uma prerrogativa das artes e pode até ser que as artes consideradas como tais venham sendo cada mais incapazes de proporcionar aquilo que Borges descreve como sendo "uma iminência de uma revelação que não se produz”. Diz Borges: "La música, los estados de la felicidad, la mitología, las caras trabajadas por el tiempo, ciertos crepúsculos y ciertos lugares, quieren decirnos algo, o algo dijeron que no hubiéramos debido perder, o están por decir algo; esta inminencia de una revelación, que no se produce, es, quizá, el hecho estético”. [Jorge Luis Borges, disponível em http://www.lanacion.com.ar/nota.asp?nota_id=814407 (acesso em 3/1/09)].

    Gilberto Freyre, em Casa Grande & Senzala, diz dos europeus, na p. 109 da minha edição de 1998: "...procuraram destruir, ou pelo menos castrar, tudo o que fosse expressão viril de cultura artística ou religiosa em desacordo com a moral católica e com as convenções europeias. Separaram a arte da vida. Lançaram fundamentos no Brasil para uma arte, não de expressão, de alongamento da vida e da experiência física e psíquica do indivíduo e do grupo social; mas de composição, de exercício, de caligrafia".

    5) Sobre a História Cultural, é Cook que fala, em The Cambridge History of Twentieth-Century Music, que "Essa ortodoxia, oferecendo uma história em torno da qual um âmbito de diferentes tradições mais conservadoras ou simplesmente diferentes podem ser agrupadas, não apenas contrói a história como um processo quase evolucionário mas também localiza esse processo na técnica da composição (2004, p.4)[1].  E mais adiante, "a história da música [pode ser] vista menos como uma questão de repertórios e estilos, e mais como uma espécie de História Cultural (com o termo 'cultura' sendo definido generosamente” (p.12)[2].

    6) Quando a Juliane fala sobre "a porcentagem de caos presente na realidade”, isso me lembra a ideia de constelação em oposição à linearidade presente nas narrativas, e é justamente aí que a experiência da Escola dos Annales pode nos auxiliar. Recomendo portanto o livro de Peter Burke A escola dos Annales, 1929-1989, a revolução francesa da historiografia. São Paulo, Editora da Unesp, 2010.  Ao preocupar-se com "a perspectiva das classes subalternas” (p.19), ou como diria Paulo Freire, em Pedagogia da autonomia, com os "esfarrapados do mundo”, essa problematização da história trazida pelos Annales elimina de cara a questão canônica (uma categoria cara aos eruditos) de arte maior ou menor. Creio que uma mentalidade pós-colonial traz em si uma concepção histórica absolutamente nova e diferente da tradição que se quis natural por tanto tempo. É atribuída a Aldous Huxley a frase que diz que a história é "contada pelos vencedores”. Pois bem, nessa nova visão, pouco nos interessa as grandes narrativas e sim o que a Escola dos Annales chamou de história serial. "Um rio”, diz Febvre (apud Burke, p.28), pode ser tratado por uma sociedade como uma barreira, mas por outra, como um meio de transporte”. Daí surgiram os conceitos de micro-história, história serial, história-problema, que analisam e estudam as correntes abaixo da superfície dos acontecimentos (BURKE, op. cit., p.118).

    Portanto, é nossa concepção de história que precisa ser atualizada, não mais como a narrativa gloriosa dos vencedores com sua grande arte, mas dependendo de nosso interesse a história vista do ponto de vista da evolução da manufatura do piano; da utilização das partituras impressas; da história do concerto público; da diáspora da música europeia pelo mundo (inclusive pelo Brasil) etc.



    [1] "This orthodoxy, offering a headline story around which a range of more conservative or simply different traditions can be clustered, not only construes history as a quasi-evolutionary process but also locates that process in compositional technique” (2004, p.4).

    [2] "(...) music history is seen less as a matter of repertories and styles, and more as a species of cultural history (with the term 'culture' being generously defined)” [p.12].

  • 25 de abril de 2015, sábado, das 9h às 17h

  • 23 de maio de 2015, sábado, das 9h às 17h

    9h: Primeiro Tempo
    • 9h-10h: Minha exposição sobre temas que emergiram na última aula: o significado de Etnografia (ver PPS abaixo); racionalismo e interesse no discurso científico; credenciamento de disciplinas, pareceres científicos e um pouco sobre como a etnografia se reflete na gramática musical (ver artigo de Bartók abaixo).
    • 10h-11h: Fléchet (Villa-Lobos em Paris) [Vinicius]
    • 11h-12h: Guérios (Villa-Lobos): GUÉRIOS, Paulo Renato. Heitor Villa-Lobos: o caminho sinuoso da predestinação. Rio de Janeiro, FGV, 2003 (Carol)

    14h: Depois do almoço (tragam comes e bebes!)

    • 14h-15h: DeNora (Beethoven) [Neiva]
    • 15h-16h: Elias (Mozart): ELIAS, Norbert. Mozart, sociologia de um gênio. Organizado por Michael Schröter; tradução, Sérgio Góes de Paula; revisão técnica, Renato Janine Ribeiro. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1995 (Sérgio)
    • 16h-17h: Questões pendentes
  • 20 de junho de 2015, sábado, das 9h às 17h

    • SUPIČIĆ - Perpectivas pludisciplinares: dificuldades de abordagem 
    • Clássico & hegemônico (conceitos)
    • Teoria da curvatura da vara (Saviani)
    • Pirâmide Tonal: Linha de fluxo/ Configuração implícita/ Simultaneidade/ Encadeamento (Breim)
    • Lehmann (Eduardo)
    • Estratégias de inclusão e urgência: El Sistema, Heliópolis, Neojibá, o canto coral amador (Priscila)
    • Geoff Baker (eu)
    • Educação: campo maior de aplicação da pesquisa em música (Camila)
    • TRABALHO FINAL: monografia em forma de artigo científico, que relacione o projeto de pesquisa de cada um e a minha disciplina. Entregar até 31 de julho/2015. Preciso cadastrar as notas no início de agosto.