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A

A ilusão biográfica - Pierre Bourdieu

TEXTO 1

COMENTÁRIOS 


Originalmente é um dos treze capítulos que compõem as edições 62/63 da Revista Actes, da qual  Pierre Bourdieu era diretor e que contam com outras reflexões interessantes os depoimentos/ biografias nas ciências humanas. Ambas as edições contam com o título de “A ilusão biográfica”, o mesmo deste breve artigo escrito por Bourdieu. 

Em tom provocativo, o texto discorre os perigos do uso de material biográfico como fonte de pesquisa, especialmente na história e nas ciências sociais, talvez o que tenha me levado a indicá-lo: embora ácido, contém reflexões valiosas sobre o caráter e a forma de construção destas narrativas individuais, que muitas vezes incorrem em ilusão retrospectiva, ingenuamente finalista e linear, e atribuem causalidades que nem sempre correspondem às trajetórias reais dos agentes sociais.

Embora ácido, acredito ser uma crítica importante a ser levada em consideração nos trabalhos com depoimentos e biografias, especialmente na hora de cruzá-los com outras informações coletadas no campo, nas fontes e na bibliografia, mas também por dialogar com alguns conceitos importantes da sociologia bourdieusiana que valem a pena serem relidos em quem atua neste campo, como a noção de habitus e capital simbólico.


REFERÊNCIA:


BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO, Janaina; PORTELLI, Alessandro. Usos & abusos da história oral. 8. ed. Rio de Janeiro: Ed. da FGV, 2006. p. 183-191.


Por: Caio Reina Lotufo

A não história da dança ou a historiografia dos restos

Este trecho do livro da professora e dançarina Andreia Nhur - pertencente ao programa de Pós Graduação da ECA-USP, aborda uma pespectiva diferente e descentralizada em que contrapõe uma história da dança brasileira, baseada em um tradicional e hegemônico modelo europeu, baseada na história da Arte, com a história da não dança. Ou seja, como método utilizada os "restos", conforme Benjamin trata as reminiscências. Para além de recobrar um percurso historiográfico da dança que contemple os silenciados, ela trabalha com a ideia de arquivo como um lugar de poder, ressignificando-o, principalmente do ponto de vista da memória. Introduz a história oral como recurso de transformação desse panorama e prioriza a noção de testemunho.


A oralidade como fonte para a escrita das Histórias Indígenas (vários)

TEXTO 2 


COMENTÁRIOS:


A indicação deste texto vem de encontro com meu objeto de pesquisa no mestrado em História Social (Jogos dos Povos Indígenas) , mas achei importante indicá-lo pensando na diversidade de temáticas que os demais colegas postaram aqui no moodle.

O artigo, publicado na revista Tellus, constrói uma breve reflexão sobre caminhos teóricos e metodológicos para a escrita das Histórias Indígenas, especialmente no que tange à utilização da tradição oral como fonte de pesquisa histórica, demonstrando a necessidade de aproximar a história oral da etnografia no que diz respeito aos trabalhos de campo do historiador com populações indígenas (como é o meu caso). Aqui destacamos como a História Oral, de encontros aos procedimentos consagrados pela historiografia, torna-se instrumento para acessar as histórias indígenas e também possibilita escrevê-la junto dos seus protagonistas indígenas, desafiando a concepção novecentista de tratar os indígenas como povos sem escrita e por tanto ahistóricos. 

Reflexões como está nos permitem extrapolar um pouco de nosso olhar cartesiano acadêmico e pensar na possibilidade de reconhecer outras formas de expressão da oralidade e também da própria historicidade, de si e do grupo enquanto sujeito coletivo da história, debates que vão de encontro à perspectiva decolonial, ou do que um historiador mexicano (Navarrete Linares) chamou de Cosmohistória.



REFERÊNCIA: 


BARBOSA, João Mitia Antunha; MEZCASA, Joseline; FAGUNDES, Marcelo Gonzales Brasil.  A oralidade como fonte para a escrita das Histórias Indígenas. In Tellus, Campo Grande, MS, ano 18, n. 37, p. 121-145, set./dez. 2018.


Citado por Caio Reina Lotufo




Angariamento de referências sobre memória social e entrevistas

Comentário para o Texto 1: "No jogo das adequações: questões sobre a construção da memória em entrevistas", de Sandra Cristina Pereira, André Mendes e Rodrigo Cerqueira. 

Os estudos da memória tem se mostrado ricos e necessários para a área da Psicologia, tendo essa área aprendido e elaborado alguns métodos de estudo relativos a esse campo de saber vindos da Sociologia. A relação da memória se dá com a História, mas também com a estória vivida, de modo que o fato identificável no tempo é perpassado pela subjetividade que o experienciou. De acordo com o sociólogo francês Maurice Halbawchs, existe uma diferença entre memória coletiva e memória histórica, pois existem muitas memórias relativas a um fato, mas apenas uma História. A Historiografia, portanto, é essa área de conhecimento relativa à história passível de narração, isto é, aquela que é percebida por alguém que posteriormente a conta. O texto indaga-se “o que estará na base da construção da memória”, uma vez que compreende ser essa uma das fontes da História. Outras perguntas que o texto traz são: qual a relação da memória com o passado e como pode auxiliar na construção do futuro? Quais as dificuldades que existem para se reconhecer o abismo entre relato e realidade? E quais papeis são ocupados por entrevistador e por entrevistado na construção dessa memória?
O texto também deixa claro que a história oral é baseada em entrevistas, porém a entrevista não é o todo da história oral. A entrevista é um conjunto de metodologias postas em prática e a história oral é muito maior do que a possibilidade de fixação que a entrevista dá conta. O artigo também traz a descrição de um trabalho feito junto a profissionais do campo da informação cujas profissões estão em vias de se extinguir ou já se extinguiram – tais como tipógrafos, locutores de rádio, redatores etc. Descreve-se o uso de gravações em som e imagem e a posterior transcrição das entrevistas. O objetivo foi o e de criar um arquivo digital que também servisse como aporte de memória, acessível a todos. Por fim, o texto também traz a problematização da validade científica do uso de memórias orais como base de pesquisa, por remeter à imaginação e ao erro. Porém, também afirma que o lugar da história oral é hoje reconhecido, inclusive pela dimensão de arquivo de saberes humanos.

Comentário do texto 2: “A memória é a matéria essencial das entrevistas: Entrevista com José Carlos Sebe Bom Meihy”, de Agnes Francine de Carvalho Mariano

O presente texto traz a importância que conceitos tais como tempo, historicidade,  temporalidade, memória  e  história oral de vida tem ganhado dentro das discussões em ciências humanas, o que garante à História, como campo de saber, e a sua metodologia própria um lugar privilegiado na construção do pensamento em ciências humanas e comunicação. Como se trata de uma entrevista, vemos aqui a junção de forma e conteúdo na criação de um sentido. O texto faz uma aproximação entre a história oral e o jornalismo, tendo por perspectiva norteadora a centralidade do gênero ‘entrevista’. O entrevistado foi o historiador José  Carlos  Sebe  Bom  Meihy,  professor  titular  aposentado  do  Departamento  de  História  da  Universidade  de  São  Paulo, que atualmente trabalha como professor da Unigranrio e é um grande pesquisador do campo da história oral. A entrevistadora é a autora do artigo, Agnes Francine Mariano, Professora permanente do Programa de Pós-graduação em Comunicação e Temporalidades da Universidade Federal de Ouro Preto e da graduação em Jornalismo.
Como existe uma motivação da entrevistadora dentro do campo do saber da comunicação, muitas das perguntas-motrizes que encontramos no texto tem por intuito elucidar a relação da história oral com a própria comunicação. A autora aponta que existem interfaces entre os dois campos que vão além das óbvias semelhanças e que é justamente nesse lugar que está o interesse de sua investigação. Mariano aponta a História Oral como parte de um movimento de “renovação da história”, que passou a abarcar outras fontes de memória, tais como a cultura material e os relatos orais na construção de memória. Porém, é clara ao dizer que não se deve confundir o ato de gravar entrevistas com o que é “História Oral”. Diz ela:

“Ela envolve um projeto, com premissas, aportes, objetivos claros, definição de procedimentos, grupos a serem ouvidos, op-ções sobre o tratamento do material coletado, formas de devolução aos entrevistados e disponibilização pública. Neste momento, define-se a vertente do trabalho – história oral  de  vida,  história  oral  temática,  tradição  oral  ou  história  oral  testemunhal  –,  sendo  que  cada  uma  atende  a  diferentes  objetivos  e  implica  modos  distintos  de  condução. A História Oral é pródiga ainda em reflexões sobre o próprio conteúdo das entrevistas – a memória oral –, o que permite complexificar a abordagem dos dados e ajuda o pesquisador a ir além do maniqueísmo e da ingenuidade.” (MARIANO, p.3, 2020).

Em sua entrevista feita com o professor Meihy, Mariano procurou atualizar uma entrevista feita com o mesmo professor 12 anos antes. Meihy defende que a história oral precisa ser feita com preocupação ética e cuidado com os entrevistados, assumindo que o entrevistado é um colaborador para a pesquisa, e nunca só uma pessoa que “informa” sobre algo, que depois será plenamente entendido pelo pesquisador em sua solidão. Dessa forma, a ideia de colocar o entrevistado como “objeto de pesquisa” é problematizada. Ele também defende que toda a pesquisa deve ser elaborada tendo por base um projeto cujos “propósitos e critérios (...) guiarão a definição das redes de colaboradores que participarão do projeto e o destino final do material produzido.”. (MARIANO, p.4, 2020).

A pesquisa deve servir como ferramenta para ampliar o diálogo com a sociedade, de modo que o impacto que a produção científica terá sempre deverá ser considerado. Um ponto interessante que Mariano destaca da fala de Meihy é a relação da memória com o esquecimento, uma vez que eleger narrativas é também uma forma de criar sentidos. Dessa forma, os oralistas estariam particularmente interessados nos atropelos, na contagem não-cronológica, nas imprecisões, uma vez que o que se busca não é o fato histórico per se, mas as versões subjetivadas desses fatos.



Comentários feitos por Laryssa Frezze e Silva nº USP 7613455