Os estudos da memória tem se mostrado ricos e necessários
para a área da Psicologia, tendo essa área aprendido e elaborado alguns métodos
de estudo relativos a esse campo de saber vindos da Sociologia. A relação da
memória se dá com a História, mas também com a estória vivida, de modo que o
fato identificável no tempo é perpassado pela subjetividade que o experienciou.
De acordo com o sociólogo francês Maurice Halbawchs, existe uma diferença entre
memória coletiva e memória histórica, pois existem muitas memórias relativas a
um fato, mas apenas uma História. A Historiografia, portanto, é essa área de
conhecimento relativa à história passível de narração, isto é, aquela que é
percebida por alguém que posteriormente a conta. O texto indaga-se “o que
estará na base da construção da memória”, uma vez que compreende ser essa uma
das fontes da História. Outras perguntas que o texto traz são: qual a relação
da memória com o passado e como pode auxiliar na construção do futuro? Quais as
dificuldades que existem para se reconhecer o abismo entre relato e realidade?
E quais papeis são ocupados por entrevistador e por entrevistado na construção
dessa memória?
O texto também deixa claro que a história oral é baseada em entrevistas, porém
a entrevista não é o todo da história oral. A entrevista é um conjunto de metodologias
postas em prática e a história oral é muito maior do que a possibilidade de
fixação que a entrevista dá conta. O artigo também traz a descrição de um
trabalho feito junto a profissionais do campo da informação cujas profissões
estão em vias de se extinguir ou já se extinguiram – tais como tipógrafos, locutores
de rádio, redatores etc. Descreve-se o uso de gravações em som e imagem e a
posterior transcrição das entrevistas. O objetivo foi o e de criar um arquivo
digital que também servisse como aporte de memória, acessível a todos. Por fim,
o texto também traz a problematização da validade científica do uso de memórias
orais como base de pesquisa, por remeter à imaginação e ao erro. Porém, também
afirma que o lugar da história oral é hoje reconhecido, inclusive pela dimensão
de arquivo de saberes humanos.
Comentário do texto 2: “A memória é a matéria essencial das
entrevistas: Entrevista com José Carlos Sebe Bom Meihy”, de Agnes Francine de
Carvalho Mariano
O presente texto traz a importância que conceitos tais como tempo,
historicidade, temporalidade, memória e
história oral de vida tem ganhado dentro das discussões em ciências
humanas, o que garante à História, como campo de saber, e a sua metodologia
própria um lugar privilegiado na construção do pensamento em ciências humanas e
comunicação. Como se trata de uma entrevista, vemos aqui a junção de forma e
conteúdo na criação de um sentido. O texto faz uma aproximação entre a história
oral e o jornalismo, tendo por perspectiva norteadora a centralidade do gênero ‘entrevista’.
O entrevistado foi o historiador José
Carlos Sebe Bom
Meihy, professor titular
aposentado do Departamento
de História da
Universidade de São
Paulo, que atualmente trabalha como professor da Unigranrio e é um
grande pesquisador do campo da história oral. A entrevistadora é a autora do
artigo, Agnes Francine Mariano, Professora permanente do Programa de
Pós-graduação em Comunicação e Temporalidades da Universidade Federal de Ouro
Preto e da graduação em Jornalismo.
Como existe uma motivação da entrevistadora dentro do campo do saber da
comunicação, muitas das perguntas-motrizes que encontramos no texto tem por intuito
elucidar a relação da história oral com a própria comunicação. A autora aponta
que existem interfaces entre os dois campos que vão além das óbvias semelhanças
e que é justamente nesse lugar que está o interesse de sua investigação.
Mariano aponta a História Oral como parte de um movimento de “renovação da
história”, que passou a abarcar outras fontes de memória, tais como a cultura
material e os relatos orais na construção de memória. Porém, é clara ao dizer
que não se deve confundir o ato de gravar entrevistas com o que é “História
Oral”. Diz ela:
“Ela envolve um projeto, com premissas, aportes, objetivos claros, definição de
procedimentos, grupos a serem ouvidos, op-ções sobre o tratamento do material
coletado, formas de devolução aos entrevistados e disponibilização pública.
Neste momento, define-se a vertente do trabalho – história oral de
vida, história oral
temática, tradição oral
ou história oral
testemunhal –, sendo
que cada uma
atende a diferentes
objetivos e implica
modos distintos de
condução. A História Oral é pródiga ainda em reflexões sobre o próprio
conteúdo das entrevistas – a memória oral –, o que permite complexificar a
abordagem dos dados e ajuda o pesquisador a ir além do maniqueísmo e da
ingenuidade.” (MARIANO, p.3, 2020).
Em sua entrevista feita com o professor Meihy, Mariano
procurou atualizar uma entrevista feita com o mesmo professor 12 anos antes.
Meihy defende que a história oral precisa ser feita com preocupação ética e
cuidado com os entrevistados, assumindo que o entrevistado é um colaborador
para a pesquisa, e nunca só uma pessoa que “informa” sobre algo, que depois
será plenamente entendido pelo pesquisador em sua solidão. Dessa forma, a ideia
de colocar o entrevistado como “objeto de pesquisa” é problematizada. Ele
também defende que toda a pesquisa deve ser elaborada tendo por base um projeto
cujos “propósitos e critérios (...) guiarão a definição das redes de colaboradores
que participarão do projeto e o destino final do material produzido.”. (MARIANO,
p.4, 2020).
A pesquisa deve servir como ferramenta para ampliar o
diálogo com a sociedade, de modo que o impacto que a produção científica terá
sempre deverá ser considerado. Um ponto interessante que Mariano destaca da
fala de Meihy é a relação da memória com o esquecimento, uma vez que eleger
narrativas é também uma forma de criar sentidos. Dessa forma, os oralistas
estariam particularmente interessados nos atropelos, na contagem
não-cronológica, nas imprecisões, uma vez que o que se busca não é o fato
histórico per se, mas as versões subjetivadas desses fatos.
Comentários feitos por Laryssa Frezze e Silva nº USP 7613455