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Esta disciplina tem por objetivo colocar a moral e a ética sob o escrutínio do pensamento antropológico e interpelar, muito especialmente, os sentimentos morais no campo político em articulação com marcadores sociais da diferença na forma como operam a desigualdade e instituem sujeitos políticos e coletividades.  Serão percorridos manuscritos clássicos e etnografias contemporâneas que abordem o tema.

O evolucionismo e o etnocentrismo são lidos como o “outro” do pensamento antropológico. Evitar juízos de valor em sua prática é o desafio que a antropologia coloca aos seus profissionais. Na história da disciplina há um evidente desconforto com a moral, tema sobre o qual a filosofia se debruça desde seus primórdios. Neste sentido, durante o processo de constituição do que denominamos de antropologia moderna, a moral - e também as emoções - foram tratadas como terrenos movediços que poderiam conduzir para dimensões normativas ou de menor importância, já que moral poderia ser subsumida no social e na cultural, não necessitando assim de estudos específicos. No caso das emoções, a evitação é ainda mais pronunciada por terem sido deslocadas para a ordem da intimidade e do privado.

Justificativa

Na perspectiva antropológica, a moral foi frequentemente absorvida às regras (Durkheim) ou aos costumes (Boas), não justificando a criação de um campo próprio. Concomitantemente, a moral (com sua dimensão normativa) confronta o relativismo cultural, percepção central à constituição de uma ideia de cultura no plural (culturas locais, circunscritas, ao invés de Cultura em sua dimensão universalizante e associada à ideia de civilização). Esta seara corre o risco de (re)instituir uma perspectiva moralizadora, temem alguns. Ainda que não caiba ao antropólogo julgar, as relações sociais aportam um conteúdo moral que frequentemente se torna mais ou menos evidente na experiência cotidiana através do entendimento se há ou não correção normativa das regras que informam as suas ações e as de outrem. 

Contudo, estaria a produção antropológica destituída de moralidade? Didier Fassin argumenta que a antropologia sempre esteve entre o relativismo e o universalismo, sendo ela mesma uma disciplina moral por ter “a vocação de tornar o mundo melhor”. A produção feminista tem reforçado a importância de situar o sujeito que produz conhecimento justamente para que seu lugar social informe sua inevitável parcialidade: experiências, engajamentos e distanciamentos. A perspectiva antropológica permite interpelar os regimes morais a partir de sua produção cotidiana em relações e sujeitos concretos, para além da transcendência de conceitos, como nos sustenta Veena Das. 

Importa nesta disciplina percorrer autoras/es que nos habilitem a uma abordagem política e histórica da moralidade e da ética contemplando, muito especialmente, moralidades ultraconservadoras e, concomitantemente, a linguagem dos direitos humanos na contemporaneidade (com suas práticas, construção e reconhecimento de sujeitos e atenção e projeção de formas de resistência). Paralelamente, serão analisadas em perspectiva comparada internacional políticas de raça, gênero, sexualidade e identidades nacionais, observadas sob a ótica do sofrimento, da moral e da compaixão. A moral e os sentimentos morais serão abordados como uma categoria êmica articulada a economias morais, com particular atenção aos valores e formas de ação mobilizados pela extrema-direita. No campo geopolítico contemporâneo interessa interpelar a moral como normas e valores e, concomitantemente, a moral como verdade de e sobre si. 


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