O curso abordará em perspectiva comparatista a pintura (Natureza Morta) e a Lírica, focando os pontos que adquirem relevo com a sobreposição de poema e quadro: o papel e dimensão da subjetividade (a voz de um eu, os objetos no recinto privado); o afastamento em relação aos grandes temas e narrativas; a relação com um mundo de coisas; a relação com a natureza. Aspecto fundamental será a constituição de um fechamento ou recuo (seja do eu lírico, seja dos objetos representados na pintura) a um lugar que se dá a apreender como espaço da interioridade (com diferentes implicações, na Lírica e na pintura de Natureza Morta). O corpus do curso será formado de poemas (Bandeira, Drummond, Jorge de Lima, Rilke, William Carlos Williams, Baudelaire) e de quadros do século XVI e XVII, nos Países Baixos (Brueghel, Willem Kalf, De Heem, Clara Peters, entre outros), com alguns exemplos também da pintura espanhola, no mesmo período. A aproximação de quadro e poema não se fará, está claro, supondo influências ou relações diretas, mas sim, levando em conta a espécie de pergunta que cada um desses objetos (quadro e poema) pode fazer ao outro, em suas semelhanças, mas também e principalmente em suas dessemelhanças. O curso enfocará cada um dos pólos do eixo comparativo (lírica e natureza morta) em relação ao contexto que os engendrou e impulsionou, tomando como âmbito de estudo não apenas a sua forma e representação, como também a origem dos objetos ali representados (oriundos, nos quadros, muitas vezes, das relações coloniais e mercantis). Para que esses objetivos se efetuem, a atenção se detém, como método de leitura e interpretação, sobre a mediação entre forma e processo social, somando, ao enfoque voltado ao contexto do surgimento dos dois gêneros (Lírica e Natureza Morta modernas), os pressupostos e categorias que permitem o pensamento e reflexão sobre quadro e poema, em sua singularidade.