Coleção 5 – Fundações por estacas : tipos, aspectos construtivos.

 

1) Para responder a esta pergunta seria essencial conhecer o levantamento plani-altimétrico e o projeto de arquitetura do edifício (para conhecer a implantação do edifício no terreno, os níveis dos subsolos, e estimar prováveis cotas de arrrasamento das estacas), o projeto da estrutura (pois sem conhecer as cargas em jogo é impossível fazer uma boa escolha de estacas), os possíveis condicionantes impostos pela vizinhança. Também é necessário conhecer bem os tipos de estacas disponíveis no mercado, sua aplicabilidade, vantagens e desvantagens (capítulos 8 e 9 do Fundações: Teoria e Prática e tabelas do tipo daquelas fornecidas nesta coleção). Apenas com as poucas informações disponíveis no exercício, o que se pode fazer é decidir quais tipos não utilizar.

1a) Examine cada linha das tabelas fornecidas e procure identificar os motivos que levariam a rejeitar, neste perfil, aquele tipo de estaca. Um ou mais tipos passarão no teste, é claro.

1b) NA na mesma cota do caso anterior, mas aqui há uma camada de 2 m de areia argilosa medianamente compacta, que poderia introduzir alguma dificuldade para estacas escavadas, em especial aquelas sem revestimento, mas também na recuperação do revestimento (estrangulamento de fuste?). Mas a situação seria muito mais restritiva caso se tratasse de uma camada de areia pura, com alta condutividade hidráulica, especialmente se a carga hidráulica fosse elevada (NA alto em relação à cota da escavação na areia). Já a areia em questão é argilosa, provavelmente não muito permeável (como está rasa, um poço-teste poderia confirmar) e sob carga hidráulica relativamente baixa (~ 4 m). Volte a examinar a tabela. A conclusão deve ser parecida com a do item 1a).

1c) Camada espessa de solo mole afasta da recomendação os tipos de estacas nos quais pode haver estrangulamento de fuste, perda de verticalidade, perda de linearidade. Discuta quais são esses tipos. Franki seria possível, mas não a “standard” e sim a Franki tubada, com revestimento “perdido” (incorporado).

1d) Areias pouco argilosas, sujeitas a altas cargas hidráulicas: riscos de estrangulamento de fuste em vários tipos de estacas. Strauss inviável também (não exclusivamente!) por não haver uma camada bem pouco permeável onde a ponta pudesse parar para se promover a lavagem (limpeza) do furo.

 

2) Pré-moldada e hélice contínua provavelmente disputariam a escolha. Nesse caso as pré-moldadas provavelmente resultariam mais curtas (a confirmar utilizando os processos de previsão de capacidade de carga, por exemplo Décourt-Quaresma e Aoki-Velloso – coleção 6; ver Velloso e Lopes + Fundações: Teoria e Prática). Vizinhos sensíveis a vibrações e barulho? Então provavelmente hélice contínua. Strauss: teoricamente possível, sem grandes problemas de estrangulamento de fuste, camada de argila abaixo do NA é adequada para embutir a ponta e lavar... mas controle de execução é precário e não se recomenda para obra com essa responsabilidade (edifício).

 

3) Projetos de fundações de edifícios com cargas de pequenas a médias geralmente ficam mais econômicos se escolhida uma estaca tal que resultem três estacas para o pilar de carga média. Tamanho dos blocos tem grande influência nos custos. Evita-se, em geral, encomendar mais que dois diâmetros de estacas para a obra. Cargas estão no intervalo 1000 a 6000 kN. Pilar médio deve estar em torno de 3500 a 4000 kN. Outra indicação: n = número de andares (20 no caso); pilares menores: 100 n = 2000 kN; pilares intermediários: 200 n = 4000 kN; pilares maiores: 300 n = 6000 kN. Escolha: estacas para carga de trabalho de 1300 kN (≈4000/3). Como peça estrutural, essa estaca romperia com uma carga bem maior do que essa (relembrar os ponderadores do cálculo de concreto), mas estará bem aproveitada, dentro dos limites de segurança do concreto, se puder ser solicitada até 1300 kN. Resta saber como fazer para que o solo também resista a essa carga (exercício 4 desta coleção, exercício 1 da coleção 6).

 

4) A carga nominal da estaca é apenas um dos elos da corrente. Se não penetrar suficientemente no terreno, não se desenvolverão reações, na ponta e ao longo do fuste da estaca, que igualem os 1300 kN. Ou seja, é essencial procurar uma profundidade tal que o solo também ofereça uma reação de 1300 kN, de modo a tirar pleno proveito da seção transversal escolhida para a estaca.

Para alguns tipos de estaca, pré-moldadas em particular, há uma regra empírica antiga que recomenda que a somatória dos valores de NSPT, da cota de arrasamento até a cota da ponta, seja igual ou maior do que 1,5 x tensão normal de trabalho na estaca (em kgf/cm2). No caso em questão, por exemplo, uma estaca de 58 cm de diâmetro (ver tabela), trabalhando com cerca de 50 kgf /cm2, demandaria uma somatória de \(N_{SPT}\) de 75 (1,5 x 50). Uma primeira ideia de comprimento das estacas pré-moldadas seria portanto, nesse caso, cerca de 7 m, com ponta na transição para a argila siltosa, pouco arenosa, rija. Como há terrenos menos resistentes (NSPTs menores) abaixo da ponta, essas estacas pré-moldadas trabalhariam claramente com uma importante contribuição de atrito lateral. Seria importante confirmar essa estimativa por meio de um dos processos semi-empíricos consagrados (o de Décourt-Quaresma é o mais utilizado para estacas pré-moldadas). Processos conceitualmente similares, mas específicos para estacas hélice contínua, provavelmente levariam a comprimentos maiores, até a camada de argila siltosa, pouco arenosa, dura. Além dos processos semi-empíricos já citados — Décourt-Quaresma e Aoki-Velloso —, para o caso específico de estacas hélice contínua são mais utilizados os de Antunes-Cabral e de Alonso.

Todos esses processos semi-empíricos baseiam-se na idéia de calcular a força resistente oferecida pelo solo para a profundidade escolhida (ruptura geotécnica), levando em conta, da cota de arrasamento até a ponta da estaca, a medida mais usual de resistência do solo de que se dispõe: os números de golpes do SPT. Ou seja, essencialmente uma sofisticação da regra empírica antiga baseada na somatória dos NSPT, para levar em conta também o tipo de estaca e os tipos de solos atravessados. Coeficientes parciais de “segurança”, normalmente com valores diferentes para a parcela de atrito lateral — ao longo do fuste — e para a parcela de ponta, reduzem essa força resistente estimada à carga de trabalho (que se deseja igual à carga de trabalho da estaca como peça estrutural, 1300 kN no nosso exemplo). Por que “segurança” entre aspas? Porque, mais do que segurança, há aí uma questão de compatibilidade. Para estacas, assim como para tubulões, continua havendo a mesma questão de desenvolvimento de tensões de ruptura para deslocamentos diferentes na interface fuste-solo e na base (ponta). Veja discussão no exercício 9 da coleção 4. Dessa forma, com 1 cm de recalque no topo da estaca, o atrito lateral já pode estar praticamente todo mobilizado ao longo do fuste, enquanto esse recalque não passa de 1,7% do diâmetro de uma estaca de 58 cm, muito aquém portanto da ruptura da ponta, que só ocorreria por volta de 6 a 10 cm de recalque. Ou seja, para uma situação de trabalho compatível, a carga de ruptura da ponta tem que ser dividida por um coeficiente parcial bem maior do que o coeficiente parcial do atrito lateral; em situação de trabalho, a ponta está em geral mais distante da ruptura do que o atrito lateral. Mesmo assim, a NBR6122/2010 impõe também fator de segurança global 2 aplicado à resistência geotécnica da estaca, a soma da resistência de atrito lateral e da resistência de ponta.

Observe-se ainda que essa discussão do comprimento das estacas foi balizada por um ELU, pela sua ruptura, por meio de processos semi-empíricos baseados na estimativa da força resistente. Compare essa situação com aquela do exercício 4 da coleção 4: em tubulões quase nunca se fala em ELU! Por que? Porque os diâmetros de muitas estacas são bem menores do que os diâmetros das bases dos tubulões. Como a ruptura da ponta ocorre para recalques de 10 a 20% do diâmetro, nessas estacas de menor diâmetro a ruptura já passa a ser mais condicionante para o dimensionamento do que o ELS. Por isso não são muito usuais, entre nós, os cálculos de recalques de estacas... embora para estacas de grande diâmetro essa prática merecesse revisão.

Última atualização: domingo, 7 mai. 2017, 14:08