CRIAÇÃO DA ADAPS E A PRIVATIZAÇÃO DA APS
*CRIAÇÃO DA ADAPS - ATAQUE AO SUS EM MEIO À CRISE DO CORONAVÍRUS*
As
entidades que subscrevem essa nota demonstram aqui sua profunda
indignação à atitude oportunista de homologação pelo Governo Bolsonaro,
em plena pandemia pelo Coronavírus, do Decreto 10.283, de 20 de março de
2020, que institui a Agência Para o Desenvolvimento da Atenção Primária
à Saúde (ADAPS). Essa medida é potencialmente indutora de uma maior
precariedade no âmbito da organização do Sistema Único de Saúde (SUS), e
mais especificamente da Estratégia Saúde da Família (ESF).
Apesar
do nome que poderia sugerir uma postura “desenvolvimentista”, a ADAPS é
nada mais do que a criação de uma entidade do Terceiro Setor,
denominada de Serviço Social Autônomo (SSA), um ente privado e não
estatal (apesar de criada pelo governo) com natureza jurídica próxima a
outras experiências como as Organizações Sociais de Saúde (OSS), só que
agora com uma dimensão nacional, que irá usurpar atribuições antes da
alçada da União, estados e municípios em relação ao ordenamento e
funcionamento de serviços de atenção primária do país.
Com
o estabelecimento dessa agência já se iniciaram as mensagens à médicos
participantes do 13º ciclo do Projeto Mais Médicos para o Brasil (PMMB)
que serão desligados dos serviços de saúde até o dia 25 de abril.
Ou
seja, em plena pandemia, onde se precisa maximizar esforços de
disponibilidade de força de trabalho, o Governo Bolsonaro irá realizar
um “cavalo de pau” nas ações de provimento nacional para os serviços da
Estratégia Saúde da Família, o que poderá piorar sobremaneira as
condições de acesso da população à serviços de saúde em diversas das
áreas mais vulneráveis socialmente do Brasil.
Possivelmente
se implementará uma lógica de uberização na contratação de médicos,
dentro dos parâmetros que serão dados pela criação da Carteira de
Trabalho Verde-Amarela, e a fragilização da atual Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT), pela reforma trabalhista que corre em paralelo.
Também
chama a atenção a criação dessa agência no mesmo momento onde foram
liberados R$ 10 bilhões de reais aos planos de saúde. Ou seja,
possivelmente a ADAPS poderá ter relações como intermediadora para a
contratação de serviços privados para prestação assistencial de saúde à
população, aproveitando-se da situação de crise para realização de
negócios duvidosos, visto o controle público muito mais frouxo a estes
entes do terceiro setor por órgãos de controle como Tribunal de Contas e
Corregedoria Geral da União.
Tal
distorção surge no mesmo momento em que se ampliam a demanda de
investimentos para os serviços públicos do Sistema Único de Saúde (SUS),
que tem se mostrado “a grande ponta de lança” na luta contra o
Coronavírus, apesar das dificuldades enfrentadas pelos seus
profissionais como melhores condições de trabalho, de proteção
individual, de testagem de casos e de ações vigilância em saúde mais
efetivas em plena pandemia, mas que têm sido bravamente aplaudidos pela
população que percebe o SUS como o principal braço do Estado frente às
demandas de saúde mais diretamente colocadas.
Assim
alertamos sobre as conseqüências à médio prazo da implementação da
ADAPS. Diversas experiências nacionais mostram que a grande extensão não
só da terceirização na contratação de profissionais de saúde, como da
gestão de serviços, NÃO É UM MODELO SUSTENTÁVEL E ESTÁVEL para
organização da gestão do SUS, bem como grandes portas para corrupção e
de caixa 2 para campanhas eleitorais.
Exemplos
dessas situações são episódios como o total desmonte em curso na
Atenção Primária à Saúde (APS) da cidade do Rio de Janeiro, a CPI da
Saúde pela Assembléia Legislativa do estado de São Paulo, e a crise com a
Cruz Vermelha, no estado da Paraíba, para elencar problemas de
ampliação de gestão por Organizações Sociais de Saúde (OSS); e também
merece atenção a crise da experiência de Serviço Social Autônomo (SSA),
no estado Acre, dentre vários outros episódios em todo o país.
O
entendimento de que a contratação pelo terceiro setor é um modelo
alternativo aos limites de contratação de pessoal impostos pela Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF), diante do teto estabelecido, não tem mais
unanimidade junto aos órgãos de controle, que vem considerando esse
modelo de contratação como burla aos procedimentos habituais de
transparência, isonomia e providência a serem respeitados pelas
instituições públicas, inclusive diante dos escândalos cada vez mais
frequentes.
Assim recomendamos frente a esta
medida intempestiva do Governo Bolsonaro, as seguintes medidas de
fortalecimento do SUS diante da crise instalada:
1-
Manter a contratação e a atuação dos médicos participantes do Projeto
Mais Médicos pelo Brasil (PMMB), experiência claramente estabelecida
como exitosa ação de provimento de profissionais médicos para a
Estratégia Saúde da Família (ESF);
2- Sustar a implementação da ADAPS, havendo maior debate com as instâncias de controle social do SUS antes de sua criação;
3-
Revogação da Portaria nº 2.979, de 12 de novembro de 2019, que
estabelece mudanças no financiamento de custeio da Atenção Primária à
Saúde no país, visto que elas poderão aprofundar o processo de
desfinanciamento da APS em diversos municípios brasileiros mais
sensíveis à crise em curso;
4- Revogação da Emenda Constitucional 95 (EC 95), que congelou os gastos sociais por um período de 20 (vinte) anos;
5-
Alteração da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) com a retirada dos
investimentos e despesas com pessoal nas áreas da saúde, educação e
assistência social do teto estabelecido pela LRF, podendo assim garantir
a expansão de força de trabalho de profissionais de saúde em momento de
crise como o atualmente instalado;
6-
Suspender a tramitação das contra-reformas propostas pelo Governo
Bolsonaro, como a trabalhista, a tributária, a da Administração do
Estado e dos Fundos Públicos, pois é necessário nesse momento ampliar
medidas de proteção social frente às dificuldades vividas pela nossa
população;
7- Revogar a
Medida Provisória nº 927, lançada na surdina no dia 22 de março de 2020,
autorizando empresas a suspenderem empregados por quatro meses,
deixando os trabalhadores sem salários, o que fragiliza ainda mais
medidas de proteção, ampliado medidas de arrocho ao trabalhador e
assalariados.
8-
Garantia de renda mínima para todos os cidadãos e cidadãs de nosso país,
a partir de recomendações dadas pela própria Organização Mundial de
Saúde (OMS).
Assinam a nota
1- Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares (RNMMP)
2- Associação Paulista de Saúde Pública (APSP)
3- Associação Brasileira de Saúde mental (ABRASME)
4- Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABRES);
5- Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (CEBES);
6- Associação Brasileira Rede Unida;
7- Sociedade Brasileira de Bioética (SBB)
8- Forum de Trabalhadores de Saúde Mental de Pernambuco;
9- Nucleo Estadual da Luta Antimanicomial de Pernambuco - Libertando Subjetividades;
10 - Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (RENILA);
11- Fórum Mineiro de Saúde Mental;
12- Frente Mineira Drogas e Direitos Humanos.
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