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Discurso, por Foucault

por Talita Carvalho da Mota e Silva - terça-feira, 25 jun. 2013, 17:00
 

O discurso, em nossa cultura (e, sem dúvida, em muitas outras), não era originalmente um produto, uma coisa, um bem; era essencialmente um ato - um ato que estava colocado no campo bipolar do sagrado e do profano, do lícito e do ilícito, do religioso e do blasfemo. Ele foi historicamente um gesto carregado de riscos antes de ser um bem extraído de um circuito de propriedades.
Quando se instaurou um regime de propriedade para os textos, quando se editoram regras estritas sobre os direitos do autor, sobre as relações autores-editores, sobre os direitos de reprodução etc. - ou seja, no fim do século XVIII e no inicio do século XIX -, é nesse momento em que a possibilidade de transgressão que pertencia ao ato de escrever adquiriu cada vez mais o aspecto de um imperativo próprio da literatura.
Como se o autor, a partir do momento em que foi colocado no sistema de propriedade que caracteriza nossa sociedade, compensasse o status que ele recebia, reencontrando assim o velho campo bipolar do discurso, praticando sistematicamente a transgressão, restaurando o perigo de uma escrita na qual, por outro lado, garantir-se-iam os benefícios da propriedade.
Os textos, os livros, os discursos começaram a ter realmente autores (diferentes dos personagens míticos, diferentes das grandes figuras sacralizadas e sacralizantes) na medida em que o autor podia ser punido, ou seja, na medida em que os discursos podiam ser transgressores.

 

FONTE:FOUCAULT, Michel. O que é um Autor? Lisboa: Vega, 1992.

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