10 a. AULA - SEMINÁRIOS
TEXTO:
NOVAIS, Jorge Reis, Contributo para uma teoria do Estado de Direito, Coimbra, Almedina, 2013, ps. 210 a 218.
CASO PRÁTICO: O CASO DO CANTOR BRASILEIRO
O cantor e poeta brasileiro Joel teve grande apelo popular e forte presença nos meios intelectuais do país nos anos de chumbo da ditadura civil-militar brasileira. É até os dias de hoje muito lembrado, por suas canções, poemas e irreverências públicas. Sob o regime autoritário instaurado após o golpe militar, várias expressões de liberdade passam a ser restringidas. A censura é a regra, a liberdade é exceção. Ao cantor, no entanto, é consentida a permissão de realizar shows, apresentações e espetáculos públicos, desde que suas canções não atacassem o regime político. Por isso, Joel continua ativamente sua carreira musical, encriptando em suas letras mensagens apenas decodificadas por pequenos grupos de resistentes que frequentavam seus shows em busca de mensagens, orientações e senhas para agir, pois a comunicação entre os resistentes do período era muito dificultada.
A polícia secreta descobre atividades de resistentes e tortura um de seus membros, e acaba por descobrir o modo como se serviam do apoio de Joel, ainda que velado. O cantor é assassinado na rua, durante a noite, num bairro distante do centro da Cidade do Rio de Janeiro, e um morador de rua é responsabilizado pelo crime, para não despertar a ira popular.
Quinze anos após a sua morte, seu neto Ígor inquieto com o passado da família, revira documentos e arquivos antigos, encontrando um diário escrito a punho de Joel, com anotações de perseguição e intimidações, interceptação telefônica e censura de letras de música nunca reveladas a público. O diário atribui estas ações a agentes do regime, sabendo-se que a narrativa do diário segue até a véspera da data de sua morte. Ígor descobre, ainda, por força de outros arquivos, que graças a ligações de Joel com forças da resistência, o regime foi derrubado apenas 6 meses após o seu assassinato.
Após a Lei de Anistia (1979), e com a redemocratização do país (1985), e considerando que a Constituição Federal de 1988, enquanto Constituição Cidadã, oferece escudo às diversas liberdades e à cidadania, Ígor tem amparo constitucional para iniciar uma cruzada de memória e justiça, buscando a resolução jurídica do passado da família.
Recomposta a “verdade” marginal da biografia de seu avô, Ígor escreve um livro com estas memórias e pleiteia na justiça uma pensão contra o Estado, em favor de sua avó. Ígor procura os meios administrativos, e encontra em funcionamento uma Comissão de Verdade e Justiça, para a qual peticiona, alegando os fatos, apresentando as provas, mas desconhecendo os fundamentos legais.
A Comissão da Verdade e Justiça tem várias subcomissões atuando, para atenderem a diversas demandas, e você lidera uma equipe composta por 3 pessoas, sendo uma da área do Direito, uma da área da Assistência Social e outra da área da Ciência Política. Antes de se pronunciar oficialmente nos Autos do Processo Administrativo, em caráter de decisão administrativa, você resolve consultar a sua equipe, convocando uma reunião deliberativa de trabalho, para ouvir a opinião de cada um deles, a respeito do caso.
1. Apresente a opinião do membro da equipe da área do Direito, e procure definir com objetividade se o pedido elaborado por Ígor tem sustentação jurídica;
2. Apresente a opinião do membro da equipe que é da área da Assistência Social, e procure analisar as condições psicossociais de vida do poeta e da família, após a morte do poeta;
3. Apresente a opinião do membro da equipe que é da área da Ciência Política, fazendo uma recuperação de fatos históricos, dados do período, e traçando paralelos entre a situação vivida pelo poeta e vítimas de regimes repressores em vários países latino-americanos.