A disciplina procura verificar como se constituíram as primeiras interpretações a respeito de 1964 e da ordem social e política estabelecida pelo golpe por parte da sociologia e da ciência política brasileiras. Interessa-nos, em especial, explorar a relação entre essas análises e a política, que as informou diretamente.  De maneira complementar e em menor detalhe, se busca investigar interpretações a respeito da crise atual da democracia brasileira, adotando como recorte histórico fundamental o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016. Até porque parece-nos que o desafio colocado por 1964 é, em boa medida, comparável ao do tempo presente, ambas as situações tendo imposto a revisão da maneira como se pensa a sociedade e a política brasileira.

É verdade que os dois contextos com os quais trabalharemos são muito diferentes, até porque o fato dominante quando ocorre o golpe de1964, a Guerra Fria, não existe mais. No entanto, de maneira mais profunda, nosso problema, assim como o do pós-1964, é a democracia, questão que, na verdade, não era evidente para os diferentes atores políticos antes do golpe, mas que se tornou, durante o autoritarismo, decisiva. Nesse sentido, é possível dizer que há um quadro comum entre os dois períodos que discutiremos que torna possível a aproximação entre eles.

Privilegiaremos como material de estudo uma série de trabalhos que buscaram analisar estes “momentos decisivos” e nos quais estão mais ou menos explícitas interpretações abrangentes a respeito do Brasil, as quais, tradicionalmente se associa o pensamento político e social brasileiro.

Justificativa

1964 não foi propriamente “um raio caído em céu azul”. Antes do golpe havia expectativas de tal desenlace, fosse ele favorável à direita ou à esquerda. Mesmo assim, consumada a ruptura, ela teve um profundo impacto. Tratou-se geralmente de início de procurar entender o que aconteceu. Consolidada a nova ordem social e política, buscou-se interpretar a sua natureza. Tal preocupação tinha uma dupla dimensão; analítica e normativa, teórica e política, tendo afetado particularmente as ciências sociais, das quais muito de seus pesquisadores eram ou tinham sido militantes políticos.

Já o processo que leva ao impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, faz com que se pergunte até que ponto a democracia está consolidada no Brasil. Neste sentido, o curso busca se somar ao esforço de compreensão do momento atual recorrendo, no nosso caso, à história do pensamento político e, em especial, às interpretações a respeito da ordem social e política instalada em 1964. Indaga-se, nesse sentido, como as análises que se dedicaram a esse momento histórico podem – ou não – iluminar a nossa atual crise política e social.     

Ao tratar de interpretações de 1964 e de 2016, tomamos a história tanto como objeto como abordagem. Trata-se de investigar momentos decisivos na constituição da democracia no Brasil; em primeiro lugar, a da busca da compreensão do chamado autoritarismo, o que era entendido então como esforço necessário para se poder enfrentar a ordem social e política criada pelo golpe. Este esforço, realizado basicamente nos anos 1960 e 1970, abre caminho para uma nova ordem, cujo marco é a Constituição de 1988, fortemente questionada nos últimos anos. Estamos, portanto, numa posição privilegiada, a partir da qual, procuraremos explorar tanto as possibilidades como os limites da democracia no Brasil. 

Critérios de avaliação

Serão realizados uma prova, no meio do curso, (40% da nota) e uma prova ou trabalho final (60%) no final do curso. A nota final será resultado dessas atividades.

Conteúdo:

1.     Apresentação do curso. (14 e 15/03)

Bibliografia complementar:

NAPOLITANO, Marcos. “Roteiro de leituras para o estudo do golpe civil-militar de 1964”. Guia bibliográfico da FFLCH. São Paulo: FFLCH, 2016.

2.     A busca da caracterização do pós-1964 (21 e 22/03)  

FURTADO, Celso. “Da república oligárquica ao Estado militar”. Brasil: Tempos Modernos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. (original: “De l ́oligarchie à l ́État militaire”. Le Temps modernes. v. 23, n. 257, pp. 578 – 601, 1967).

JAGUARIBE, Hélio. “Brasil: estabilidade social pelo colonial fascismo”. Brasil: Tempos Modernos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. (original: “Stabilité sociale par le ‘colonial-fascisme”. Le Temps modernes. v. 23, n. 257, pp. 603 – 623, 1967).

3.     e 4. O colapso do populismo (28 e 29/03; 11 e 12/04)

IANNI, Octavio. O colapso do populismo no Brasil. Cap. I: “O sentido das crises”; Cap. V: “Getulismo e política de massas”; Cap. VII: “A esquerda e as massas”; Cap. IX: “O golpe de Estado”; “Conclusão”. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.

WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. Cap. 2: “Estado e massas no Brasil”. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

5.     Autoritarismo (18 e 19/04)

LINZ, Juan. “The future of an authoritarian situation or the institutionalization of an authoritarian regime: the case of Brazil”. STEPAN, Alfred. Authoritarian Brazil. New Haven: Yale University Press, 1973.

6.     Um novo tipo de golpe de Estado? (25 e 26/04)

STEPAN, Alfred. Os militares na política. Parte III: “A ruptura do ‘padrão moderador’ das relações entre civis e militares e a emergência do governo militar”. Rio de Janeiro: Editora ArteNova, 1975.

7, 8 e 9. 1964 como revolução burguesa? (2 e 3/05; 09 e 10/05; 16 e 17/05)

CARDOSO, Fernando Henrique. “O regime político brasileiro”. Estudos CEBRAP, n. 2, pp. 83 - 118, 1972.

OLIVEIRA, Francisco. “A economia brasileira: critica à razão dualista”. Estudos CEBRAP, 2. São Paulo, pp. 3 – 82, 1972.

FERNANDES, Florestan. A revolução burguesa no Brasil. Cap. 7O modelo autocrático-burguês de transformação capitalista". Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1975.

10. PROVA (23 e 24/05)

11. O golpe parlamentar (30 e 31/05)

SINGER, André. “Três partidos brasileiros”. Lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma. São Paulo: Companhia das letras, 2018, pp. 131-161.

SANTOS, Wanderley Guilherme dos. “1964 e 2016: dois golpes, dois roteiros”. A Democracia Impedida: o Brasil no Século XXI. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2017, pp. 33-67. 

12 e 13. Bolsonaro, bolsonarismo (6 e 7/06; 13 e 14/06)

NOBRE, Marcos. “Introdução” e “Das novas direitas à eleição de Bolsonaro”. Limites da democracia: de junho de 2013 ao governo Bolsonaro. São Paulo: Todavia, 2022, pp. 9-43, 127-176.

NUNES, Rodrigo. “De que Bolsonaro é o nome”. Da vertigem ao transe: ensaios sobre o bolsonarismo e um mundo em transição. São Paulo: Ubu, 2022. pp. 33 – 85.

14. Lula, um novo recomeço? (20 e 21/06)

SINGER, André. “Lula´s return”. New Left Review, n. 139, 2023. pp. 5 – 32.

15. PROVA OU ENTREGA DE TRABALHO FINAL (28/06)