Nos anos entre 1980 e 1990 a associação de que direitos humanos seriam para bandidos e não para cidadãos foi consolidada no imaginário de algumas pessoas. Isso reforça a ideia de que só a violência é capaz de manter a ordem.

“A população de São Paulo considera o atendimento médico, a educação, as creches como seus direitos mais caros. A noção de direitos humanos, contudo, foi dissociada desses direitos sociais e passou a vincular-se cada vez mais forte e exclusivo ao grupo dos prisioneiros comuns, a ponto de que hoje em dia em São Paulo falar em direitos humanos é remeter aos prisioneiros. Essa campanha se articulou publicamente quando a cidade de São Paulo apresentou seus maiores índices de criminalidade violenta das últimas duas décadas, durante o período 1983-1985.” Texto “Direitos Humanos ou Privilégios de Bandidos? Desventuras na Democratização Brasileira”- Por Teresa Pires do Rio Caldeira, 1991

Os principais articuladores contra os direitos humanos nesse período foram representantes da polícia (que tentavam se reformar), políticos de direita e programas que abordavam crimes violentos. Esses setores ajudaram a transmitir a ideia de que Direitos Humanos são direitos de bandidos. A mensagem que era transmitida era de que:

Nos anos entre 1980 e 1990 a associação de que direitos humanos seriam para bandidos e não para cidadãos foi consolidada no imaginário de algumas pessoas. Isso reforça a ideia de que só a violência é capaz de manter a ordem. 

"Se os direitos dessa pessoa que roubou, matou ou estuprou não tivessem sido defendidos, ela não estaria em liberdade, não teria praticado esse crime".

Muitos foram os políticos e comunicadores que se elegeram a cargos políticos com o discurso:

“Vou colocar a Rota (grupo de operações especiais da Polícia Militar de São Paulo) na rua' para dizer 'aqui a gente  não dá direitos humanos para bandido” Frase notória do ex-prefeito de São Paulo, Paulo Maluf, que hoje cumpre prisão domiciliar por lavagem de dinheiro e  caixa dois eleitoral.

O discurso pode parecer convincente: explora o medo legítimo das pessoas. A ideia é: "Vou fazer o medo e a sua sensação de insegurança diminuir, perseguindo os bandidos". Mas isso não resolve o problema. Exemplo disso são os números da polícia brasileira, que matou, em 2019, 5.084 pessoas, tornando-se a polícia que mais mata no mundo. Em 2019 foram 159 oficiais assassinados em serviço. Em 2018, 104 policiais cometeram suicídio. Algo não está fechando nessa conta. Confira a reportagem aqui.


 Número de policiais mortos em caído nos últimos anos no Brasil — Foto: Wagner Magalhães e Guilherme Gomes/G1

Número de policiais mortos em caído nos últimos anos no Brasil — Foto: Wagner Magalhães e Guilherme Gomes/G1

Número de mortos por policiais tem crescido ano a ano — Foto: Guilherme Gomes e Wagner Magalhães/G1

Número de mortos por policiais tem crescido ano a ano — Foto: Guilherme Gomes e Wagner Magalhães/G1


Uma pesquisa realizada pelo Datafolha, encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2016, apontou que 57% da população de grandes cidades brasileiras concorda com a frase "bandido bom é bandido morto".  Significa que mais da metade da população de grandes cidades defende a justiça feita pelas próprias mãos, atropelando o devido processo penal do Estado democrático de direito e defendendo o fim da vida de alguém, ou seja, violando o princípio mais básico dos direitos humanos: o direito à vida.

Na prática, a afirmação é uma violação aos direitos humanos. Uma pessoa que comete crime tem direito à defesa, ao devido processo legal, e que cumpra pena à qual ela foi julgada.

Os direitos humanos não vão garantir impunidade, mas vão garantir que a pessoa tenha defesa, tenha um processo justo. Isso é difícil de entender, às vezes quando os sentimentos de "vingança", de "não querer que criminosos tenham direitos protegidos" está envolvido. Trecho da reportagem da BBC Brasil O que são direitos humanos e por que há quem acredite que seu propósito é a defesa de 'bandidos'? Juliana Gragnani. Março de 2018

É compreensível do ser humano sentir desejo de vingança quando ocorre uma injustiça. Mas o Estado não pode oficializar esse meio, ele precisa garantir a mesma medida de leis para todas as pessoas. 

   

🤔 PARA REFLETIR: Direitos humanos para humanos direitos?

Você já se perguntou o que isso significa? Ao dizer essa expressão, estamos assumindo que existe um humano bom e um humano mal, com faces totalmente opostas e que não pode se transformar.

Por exemplo, ninguém costuma gostar muito de filmes que não aprofundam seus heróis e vilões, certo?  Isso acontece porque as tramas mais aplaudidas têm complexidade, apresentam diferentes nuances. Assim como acontece na vida real: as pessoas são complexas. 

Ao usar essa frase, o sujeito está desumanizando o diferente e negando direitos básicos aos semelhantes, caindo na ideia superficial de bom e mau, de mocinhos e bandidos.

Zuletzt geändert: Donnerstag, 2. Juni 2022, 21:17