2. Segunda lei

2.1. Introdução

Em geral dada uma força resultante \(\vec{F}\) agindo em um objeto de massa inercial $m$, dadas a posição inicial $\vec{r}(t_{0})$ e a velocidade inicial $\vec{v}(t_{0})$, queremos determinar a posição $\vec{r}(t)$ desse objeto em qualquer instante de tempo $t$ posterior ao instante inicial $t_{0}$. Determinar trajetórias criadas por forças resultantes é o objetivo básico da Mecânica. A implementação desse objetivo é feita pela segunda lei $\vec{F}=\dot{\vec{p}}$, com $\vec{p}=m\vec{v}$ (momentum linear).

Para compreendermos como a segunda lei fornece trajetórias, vamos considerá-la com a massa inercial constante,\begin{equation}\vec{F}=\frac{d\vec{p}}{dt}=m\frac{d\vec{v}}{dt}.\end{equation} O lado direito da segunda lei é proporcional à aceleração, a segunda taxa de variação do vetor posição, o qual representa a trajetória na forma paramétrica. O lado esquerdo da segunda lei é proporcional à força, uma expressão matemática da interação mantida pelo objeto de massa $m$. Em princípio, estes dois vetores, força e aceleração, possuem naturezas completamente distintas. A igualdade entre eles na segunda lei somente é possível com a presença da massa inercial. Assim, as dimensões de força são \begin{equation} [\vec{F}]=\left[m\vec{a}\right]=\frac{ML}{T^{2}}.\end{equation}

Em geral, a força deve ser determinada experimentalmente, ou por conjecturas, e poderá depender da posição $\vec{r}$ e da velocidade $\dot{\vec{r}}$. Em algumas ocasiões raras, a força poderá depender da aceleração e do próprio tempo. Considerando $\vec{F}=\vec{F}(\vec{r},\dot{\vec{r}})$, a segunda lei assume a forma \begin{equation}\vec{F}\bigl(\vec{r},\frac{d\vec{r}}{dt}\bigr) = m\frac{d^{2}\vec{r}}{dt^{2}},\end{equation} ou, em coordenadas, \begin{equation} F_{i}\bigl(\vec{r},\frac{d\vec{r}}{dt}\bigr) = m\frac{d^{2}x_{i}}{dt^{2}},\; \vec{r}=(x_{1},x_{2},x_{3}).\end{equation} Portanto, do ponto de vista operacional, a segunda lei é um conjunto de três equações, tendo como incógnitas as componentes $x_{i}$ do vetor posição $\vec{r}$.

No entanto, estas não são equações convencionais, pois as incógnitas $x_{i}$ são funções do tempo $t$, $x_{i}=x_{i}(t)$. Além disso, aparecem nestas mesmas equações, as derivadas primeira e segunda destas mesmas incógnitas. Uma equação deste tipo recebe o nome de equação diferencial ordinária (ou simplesmente EDO). Um pouquinho sobre nomenclatura. As equações horárias $x_{i}=x_{i}(t)$ são as variáveis dependentes (as incógnitas). O tempo $t$ é a variável independente. Todas as derivadas numa equação diferencial ocorrem em termos das variáveis independentes. Quando temos apenas uma variável independente, como nesse caso, a equação diferencial é dita ser ordinária (EDO). Quando há mais de uma variável independente, a equação diferencial é dita ser parcial (EDP). A ordem de uma equação diferencial é dada pela ordem da derivada mais alta. Na segunda lei, a derivada mais alta é de ordem dois. Assim, nossas EDOs serão todas de segunda ordem.

Teorema 2
A solução $f=f(t,c_{1},c_{2})$ de uma EDO de segunda ordem contém duas constantes arbitrárias $c_{1}$ e $c_{2}$.

Esse Teorema 2 exige que disponibilizemos duas informações adicionais para que uma equação horária determinada pela segunda lei seja única. Estas informações adicionais serão dadas pela posição inicial $x_{i}(t_{0})$ e pela velocidade inicial $\dot{x}_{i}(t_{0})$, denominadas de condições iniciais. O instante inicial $t_{0}$ pode ser escolhido convenientemente.

Então estamos numa posição bastante confortável. Dado a força resultante $\vec{F}$ e as condições iniciais, $\vec{r}(t_{0})$ e $\vec{v}(t_{0})$, usamos as EDOs fornecidas pela segunda lei $\vec{F}=m\vec{a}$ para determinamos a trajetória $\vec{r}(t)$ e, consequentemente, o vetor velocidade $\vec{v}(t)$. O vetor aceleração já está dada pelo segunda lei $\vec{a}=\vec{F}/m$.  Isto significa que podemos prever todo o comportamento do nosso sistema em qualquer instante de tempo $t\geq t_{0}$. Esse é o programa Newtoniano para determinar trajetórias. Desta forma, podemos afirmar que a Mecânica Newtoniana é completamente determinística. Preço: aprender a resolver EDOs!