3. Taxas (Derivadas)

3.2. Aceleração

A taxa de variação do vetor velocidade é denominada de aceleração. A aceleração é um vetor e uma função do tempo \(t\).

Definição 2 (Aceleração)
A taxa de variação do vetor velocidade, ou aceleração, é uma função vetorial definida pelo processo limite \begin{equation} \label{eq:vec-a} \vec{a}(t)=\lim\limits_{\Delta t\to 0} \frac{\Delta\vec{v}}{\Delta t}\equiv \frac{d\vec{v}}{dt}= \ddot{\vec{r}}. \quad (\ast\ast) \end{equation}

Importante notar que a aceleração é também a derivada segunda do vetor posição, $\vec{a}=\dot{\vec{v}}=\ddot{\vec{r}}$. Designaremos as coordenadas do vetor aceleração por $a_{i}(t)$, ou $\dot{v}_{i}(t)$, ou ainda $\ddot{x}_{i}(t)$, com $i\in\{x,y,z\}$ ou $i\in\{1,2,3\}$, dependendo da conveniência. Não teremos uma palavra especial para designar o módulo $a$ do vetor aceleração $\vec{a}$. As dimensões de aceleração são as mesmas de comprimento por tempo ao quadrado, $[\vec{a}]=[a]=\text{L}/\text{T}^{2}$.

Exemplo. Sim, um exemplo. Seja a trajetória circular no plano $z(t)=0$ dada pela forma paramétrica \begin{equation} x(t)=R\cos\theta(t),\; y(t)=R\sin\theta(t), \end{equation} sendo $\theta$ a fase dada por \begin{equation} \theta(t)=\omega t+\varphi, \end{equation} onde $\omega$ é um parâmetro conhecido por frequência angular, $\varphi$ é a constante da fase e $R$ é o raio (igual ao comprimento do vetor posição). Então a Definição 1 nos permite calcular o vetor velocidade \begin{equation} \vec{v}=\dot{\vec{r}}=(\dot{x},\dot{y},\dot{z}). \end{equation} Efetuando as derivadas temporais, teremos \begin{equation} \begin{aligned} v_{x}&=\dot{x}=\dot{\theta}(-R\sin\theta)=-\omega R\sin\theta,\\ v_{y}&=\dot{y}=\dot{\theta}(+R\cos\theta)=+\omega R\cos\theta,\\ v_{z}&=\dot{z}=0. \end{aligned} \end{equation} Usando a Definição 2, o vetor aceleração é dado pelas derivadas temporais do vetor velocidade, \begin{equation} \vec{a}=\dot{\vec{v}}=(\dot{v}_{x},\dot{v}_{y},\dot{v}_{z}), \end{equation} onde \begin{equation} \begin{aligned} a_{x}&=\dot{v}_{x}=-\omega^{2}R\cos\theta=-\omega^{2}x(t),\\ a_{y}&=\dot{v}_{y}=-\omega^{2}R\sin\theta=-\omega^{2}y(t),\\ a_{z}&=\dot{v}_{z}=0. \end{aligned} \end{equation} Esses vetores posição, velocidade e aceleração têm algumas características interessantes. O vetor velocidade é perpendicular ao vetor posição, $\vec{r}\cdot\vec{v}=0$, e seu módulo é constante, $v=\|\vec{v}\|=\omega R$. O vetor aceleração está na mesma direção do vetor posição, mas no sentido oposto (voltada para o centro, centrípeta), $\vec{a}=-\omega^{2}\vec{r}$, e seu módulo também é constante, $a=\|\vec{a}\|=\omega^{2}R=v^{2}/R$, onde a frequência angular $\omega$ foi eliminada em função da rapidez $v$. Resultado conhecido? Agora sabe de onde veio. Verifique. Sempre que obtiver resultados algébricos, como esses, use análise dimensional para checar a consistência de seus resultados. Quais são as dimensões do parâmetro $\omega$? Como a fase (argumento de uma função trigonométrica) deve ser adimensional, então a dimensão da frequência angular $\omega$ deve ser inverso de tempo, $[\omega]=1/\text{T}$. Desta forma, tanto a velocidade quanto a aceleração estão com as dimensões corretas, $[v]=[\omega R]=\text{L}/\text{T}$ e $[a]=[\omega^{2} R]=\text{L}/\text{T}^{2}$, respectivamente.

Interpretação geométrica. Seja $v$ o módulo do vetor velocidade e $\hat{v}$ o seu versor, então, por definição $\vec{v}=v\hat{v}$. Note que o vetor $\vec{v}$ por ser a derivada do vetor posição, $\vec{v}=\dot{\vec{r}}$, é sempre tangente à trajetória (dada pela forma paramétrica representada por $\vec{r}$).  Por isso, $\hat{v}$ também é conhecido por versor tangente. O vetor aceleração, a derivada do vetor velocidade, é \begin{equation} \label{eq:acelergeral} \vec{a} = \dot{\vec{v}} = \frac{d}{dt}(v\hat{v}) = \dot{v}\hat{v} + v\dot{\hat{v}}, \end{equation} onde usamos a regra da derivada de um produto de funções (do tempo), $\vec{v}=v\hat{v}$. Durante o movimento, a direção do vetor velocidade, indicada pelo verso tangente $\hat{v}$, também muda com o parâmetro tempo. Para prosseguirmos, devemos descobrir a direção da taxa de variação $\dot{\hat{v}}$ do versor tangente $\hat{v}$. Depois devemos descobrir quem é seu módulo. Um versor tem sempre seu módulo constante, unitário, mas a derivada de um versor não precisa ter um módulo constante, muito menos unitário.

Teorema 1
A taxa de variação $\dot{\vec{A}}$ de um vetor $\vec{A}$, de módulo $A=\|\vec{A}\|$ constante, é um vetor na direção perpendicular, \begin{equation} \label{eq:txtg} \dot{A}=0\implies \vec{A}\cdot\dot{\vec{A}}=0. \end{equation} Vale a recíproca.

A demonstração é muito simples. Basta escrever o módulo ao quadrado, por conveniência, usando a Propriedade 4 do produto escalar, e tomar a derivada desta constante, \begin{equation} \frac{d}{dt}A^{2}=2A\cdot\dot{A}=0 =\frac{d}{dt}\vec{A}\cdot\vec{A}=2\vec{A}\cdot\dot{\vec{A}} \implies\vec{A}\cdot\dot{\vec{A}}=0. \end{equation}

Portanto, de acordo com o Teorema 1, a direção da taxa de variação $\dot{\hat{v}}$ do versor tangente $\hat{v}$ está na direção perpendicular à direção tangente. Denotemos esta direção perpendicular, melhor ainda de direção normal, pelo versor $\hat{n}$, $\hat{v}\cdot\hat{n}=0$. Desta forma, podemos escrever \begin{equation} \label{eq:Frenet1} \dot{\hat{v}} = v\kappa\, \hat{n}, \end{equation} onde colocamos o módulo $v$ do vetor velocidade em evidência por mera conveniência e introduzimos a função (temporal) escalar $\kappa(t)$ a ser determinada impondo que $\|\dot{\hat{v}}\| = v|\kappa|$. A análise dimensional diz que $[\hat{v}]=1$ (versores são adimensionais), $[\dot{\hat{v}}]=1/\text{T}$ e que $[v]=\text{L}/\text{T}$. Assim $[\kappa]=1/\text{L}$. Como veremos, desejamos que a função escalar $\kappa(t)$ tenha exatamente a dimensão de inverso de comprimento.

Teorema 2
O vetor aceleração pode ser decomposto em duas direções perpendiculares, uma tangente ao vetor velocidade e outra normal a ele, \begin{equation} \label{eq:veca} \vec{a} = \dot{\vec{v}} = \dot{v}\,\hat{v} + v^{2}\kappa\, \hat{n}. \end{equation} A função escalar $\kappa(t)$ é conhecida por curvatura.

Como podemos calculá-la?

Exemplo. Sim, um exemplo. Seja a trajetória circular no plano $z(t)=0$ dada pela forma paramétrica \begin{equation} x(t)=R\cos\theta(t),\; y(t)=R\sin\theta(t), \end{equation} sendo $\theta$ a fase dada por \begin{equation} \theta(t)=\omega t+\varphi, \end{equation} onde $\omega$ é um parâmetro conhecido por frequência angular, $\varphi$ é a constante da fase e $R$ é o raio (igual ao comprimento do vetor posição). Então temos o vetor velocidade \begin{equation} \begin{aligned} v_{x}&=\dot{x}=-\omega R\sin\theta=-\omega y(t),\\ v_{y}&=\dot{y}=+\omega R\cos\theta=+\omega x(t),\\ v_{z}&=\dot{z}=0, \end{aligned} \end{equation} e o vetor aceleração, \begin{equation} \begin{aligned} a_{x}&=\dot{v}_{x}=-\omega^{2}R\cos\theta=-\omega^{2}x(t),\\ a_{y}&=\dot{v}_{y}=-\omega^{2}R\sin\theta=-\omega^{2}y(t),\\ a_{z}&=\dot{v}_{z}=0. \end{aligned} \end{equation} Note que esta aceleração é centrípeta (voltada para o centro), \begin{equation} \vec{a}=-\omega^{2}\vec{r}=-\omega^{2}R\hat{r}=\omega^{2}R\hat{n}, \end{equation} onde introduzimos o versor $\hat{n}=-\hat{r}$, dirigido ao centro da trajetória. Comparando com o Teorema $(\ast\ast)$, temos $v^{2}\kappa=\omega^{2}R$, da qual resulta uma curvatura constante, $\kappa=1/R$, após usarmos $v=\omega R$. Esse resultado é emblemático: a trajetória circular tem uma curvatura constante igual ao inverso de seu raio. Onde está a importância disto? Segundo os geômetras, um reta é um círculo de raio infinito. Assim, uma reta terá uma curvatura nula. A conjectura decorrente é: curvatura pode ser usada como uma quantificação de quanto uma curva se distancia de uma reta.

Exercício 1. Determine os vetores velocidade e aceleração, e seus módulos, bem como o produto vetorial, de um objeto na trajetória no plano $z=0$ dada pela curva (círculo) na forma paramétrica \begin{equation} x(t)=R\cos(\omega t),\quad y(t)=R\sin(\omega t), \end{equation} onde $R$ é o raio. Mostre que o vetor velocidade é sempre perpendicular ao vetor posição.

Exercício 2. Determine os vetores velocidade e aceleração, e seus módulos, bem como o produto vetorial, de um objeto na trajetória no plano $z=0$ dada pela curva (parábola) na forma paramétrica \begin{equation} x(t)=2t,\; y(t)=3t-t^2,\; 0\leq t\leq 3/2. \end{equation} Observe o intervalo do parâmetro $t$ (tempo). Quais são o alcance e a altura máximas que esse objeto atinge? Em que respectivos tempos? Use o Sistema Internacional (SI) de unidades, onde comprimento está em metros (m) e tempo em segundos (s).

Exercício 3. Determine os vetores velocidade e aceleração, e seus módulos, bem como o produto vetorial, de um objeto na trajetória dada pela curva (hélice) na forma paramétrica \begin{equation} x(t)=R\cos(\omega t),\; y(t)=R\sin(\omega t),\; z(t)=t/2. \end{equation} onde $\omega$ e o raio $R$ são parâmetros arbitrários.