4. Indução

4.2. Faraday

História. Logo após a descoberta de Oersted de 1820 (relatada na seção anterior), Faraday também se dedicou ao assunto. Ao contrário de seu contemporâneo Ampère, Faraday nunca teve educação formal, substituída pela necessidade de trabalhar desde muito cedo. No entanto isso não o impediu de obter conhecimentos por si mesmo, iniciando em Química e terminando no Eletromagnetismo, proporcionando-lhe títulos honorários e várias premiações, além de uma posição como Professor. Iniciando em 1821, Faraday meticulosamente realizou uma série de experimentos sobre eletricidade e magnetismo (inspirado por Oersted e, principalmente, por Ampère) que resultou na indução eletromagnética, base para a geração de energia elétrica a partir de movimento mecânico (usina hidrelétrica). Recomendo a leitura da Seção 7.1 de Purcell-Morin para perceber a genialidade de Faraday na realização de seus experimentos e conclusões estabelecidas. A grandeza de Faraday aumenta ainda mais se levarmos em conta que suas conclusões foram obtidas apenas com base experimental, sem o embasamento matemático familiar a Ampère.

Experimentos. A simulação mostrada abaixo (ou aqui) ilustra as conclusões de Faraday. Segure e arraste o ímã (aquele com as quatro setas indicadoras de movimento) e introduza-o dentro da bobina (fio enrolado na forma circular; espiras) para induzir uma corrente elétrica no fio (que acenderá uma lâmpada). O sentido e a intensidade da corrente elétrica induzida são indicados pelo medidor de tensão (volts). Note que é necessário haver movimento do ímã (fonte de campo magnético) para induzir uma corrente elétrica no fio. Quanto mais rápido, maior a corrente.  Note que invertendo o sentido do movimento do ímã, inverte-se também o sentido da corrente. Experimente.


Experimente também com o item "Linhas de campo" ligado, para visualizar as linhas de campo (do campo magnético criado pelo ímã). Essas linhas de campo foram inventadas por Faraday, mesmo sem ter os devidos conhecimentos matemáticos sobre campos vetoriais. Experimente também com uma bobina com menos espiras: quanto mais espiras, maior a intensidade da corrente.

Lei de Faraday: a corrente induzida no fio depende diretamente da variação do fluxo do campo magnético. Faraday que não tinha conhecimentos de campos vetoriais, inventou suas "linhas de campo" para chegar a esta conclusão.

Teoria. Maxwell (1861) usou os experimentos de Faraday e deu a eles uma interpretação matemática. Para criar a corrente no fio é necessário uma força agindo nos portadores de carga. Seja uma carga \(q\) submetida a uma força $\vec{F}$. Então podemos introduzir um campo elétrico: $\vec{E}=\vec{F}/q$. Denominemos de "força eletromotriz'', por razões históricas, o trabalho por unidade de carga,

\begin{equation} \mathcal{E}=\frac{1}{q}\int\limits_{C}\vec{F}\cdot d\vec{l}= \int\limits_{C}\vec{E}\cdot d\vec{l}, \end{equation}

onde $d\vec{l}$ é o deslocamento infinitesimal ao longo da trajetória $C$ da carga $q$. Note que $\mathcal{E}$ é um escalar e não um vetor (necessário para ser uma força) com dimensões de energia por unidade de carga. Segundo Maxwell, a lei de Faraday pode ser escrita como

\begin{equation} \mathcal{E}=-\frac{d\Phi}{dt},\quad \Phi=\int\limits_{A}\vec{B}\cdot d\vec{a}, \end{equation}

onde $\Phi$ é o fluxo do campo magnético $\vec{B}$ através da superfície de área $A$, apoiada em um contorno $C$ por onde movimentam os portadores de carga.

Desta vez o sinal negativo na lei de Faraday não é uma simples escolha, mas uma exigência experimental. Usando a lei de Ampère, esta corrente induzida cria um campo magnético (de simetria circular) em torno do fio sempre no sentido de compensar (graças ao sinal negativo) a variação do fluxo do campo magnético externo. A Figura 1 ilustra essa interpretação, conhecida por lei de Lenz. Nesta figura, um campo magnético (não uniforme espacialmente) é criado pelas bobinas ligadas a um gerador de corrente, de acordo com a lei de Ampère. Uma outra bobina circular (anel) é permitida se movimentar (na direção vertical) na presença deste campo magnético, variando o fluxo no seu interior. Quanto mais densa a região em termos de linhas de campo, mais intenso é o campo. Assim, esse campo magnético é mais intenso na região próximas às bobinas que o criaram. Quando o anel se aproxima da região onde o campo é mais intenso, o fluxo através dele aumenta. Segundo a lei de Lenz, uma corrente será induzida nesse anel no sentido de criar outro campo magnético que irá compensar esse aumento do fluxo do campo magnético original. Por isso o sentido da corrente induzida $I$ indicado nessa figura (veja na Figura 2 o sentido do campo criado pela lei de Ampère).

Tabela 1: Leis de Lenz e Ampère.
Figura 1: Lei de Lenz (exemplo).
Figura 2: lei de Ampère (sinal).
 

Usando os teoremas do Apêndice 2, podemos estabelecer uma versão local para a lei de Faraday, a quarta equação de Maxwell,

\begin{equation} \mathcal{E}=\oint\limits_{C}\vec{E}\cdot d\vec{l}= \int\limits_{A}\vec{\nabla}\times\vec{E}\cdot d\vec{a}= -\frac{d\Phi}{dt}= \frac{d}{dt}\int\limits_{A}\vec{B}\cdot d\vec{a} \;\implies\; \vec{\nabla}\times\vec{E}=-\frac{d\vec{B}}{dt}, \end{equation}

onde a superfície de área $A$ está inteiramente apoiada no contorno $C$. Vale lembrar que um campo elétrico dependente do tempo não produz um trabalho nulo numa trajetória fechada (ou seja, se for dependente do tempo, não será conservativo). Note que tomando o divergente da quarta equação de Maxwell, resulta a segunda equação de Maxwell, $\vec{\nabla}\cdot\vec{B}=0$.  Note que a variação temporal de um campo magnético induz a variação espacial de um campo elétrico. É um campo induzindo o surgimento de outro.

Exercício 1. Aplique o divergente na quarta equação de Maxwell e obtenha a segunda equação de Maxwell, $\vec{\nabla}\cdot\vec{B}=0$.

Exercício 2. Reobtenha a lei de Faraday a partir da variação do fluxo do campo magnético.