Objetivos

A disciplina procura verificar como se constituíram as primeiras interpretações a respeito de 1964, confrontando-as com análises da crise atual da democracia brasileira. Assume-se tal caminho já que o desafio colocado pelo golpe sexagenário é, em boa medida, comparável ao do tempo presente, ambas as situações tendo imposto a revisão da maneira como se pensa a sociedade e a política brasileira.

É verdade que os dois contextos com os quais trabalharemos são muito diferentes, até porque o fato dominante quando ocorre 1964, a Guerra Fria, não existe mais. No entanto, de maneira mais profunda, nosso problema, assim como o do pós-golpe militar, é a democracia, questão que, na verdade, não era evidente para os diferentes atores políticos antes de 1964, mas que se tornou, durante o autoritarismo, decisiva. Nesse sentido, é possível dizer que há um quadro comum entre os dois períodos que discutiremos que torna possível a aproximação entre eles.

Privilegiaremos como material de estudo uma série de trabalhos que buscaram entender, frequentemente “a quente,” esses “momentos decisivos” e nos quais estão mais ou menos explícitas interpretações abrangentes a respeito do Brasil. Buscaremos especialmente as “formas de pensar” subjacentes a tais análises. Pode-se destacar inicialmente a presença de interpretações “institucionalistas” e “estruturalistas” para explicar as duas situações. No entanto, nem todas as análises se apresentam de forma pura ou se enquadram numa linha ou outra. Consequentemente, o esforço de mapear as explicações não deve ser classificatório, mas principalmente heurístico.

Justificativa

1964 não foi propriamente “um raio caído em céu azul”. Antes do golpe havia expectativas de tal desenlace, fosse ele favorável à direita ou à esquerda. Mesmo assim, consumada a ruptura, ela teve um profundo impacto. Tratou-se geralmente de início de procurar entender o que aconteceu. Consolidada a nova ordem social e política, buscou-se interpretar a sua natureza. Tal preocupação tinha uma dupla dimensão; analítica e normativa, teórica e política, tendo afetado particularmente as ciências sociais, das quais muito de seus pesquisadores eram ou tinham sido militantes políticos.

Em contraste com 1964, cujo marco da crise é o próprio golpe, atualmente há uma certa disputa em relação a quando a crise da democracia se iniciou, havendo mesmo aqueles que questionam se a democracia está realmente em crise. Há tanto autores que destacam a revolta mais ou menos espontânea que estourou em 2013, como outros que prestam atenção especialmente ao impeachment de 2016 e, finalmente, aqueles que dão importância principalmente à eleição, em 2018, de um presidente de extrema-direita. Escolher um ou outro momento tem implicações na análise, ajudando mesmo a estabelecer como se focará a crise. Nesse sentido, o impeachment de Dilma Rousseff é uma referência entre outras. 

O curso busca assim se somar ao esforço de compreensão do momento atual recorrendo, no nosso caso, à história do pensamento político e, em especial, às interpretações a respeito da ordem social e política instalada em 1964. Indaga-se, nesse sentido, como as análises que se dedicaram a esse momento histórico podem – ou não – iluminar a nossa atual crise política e social. Chamamos a atenção, em especial, como certas categorias, como “populismo”, “autoritarismo”, etc. reaparecem, modificadas, nos contextos com os quais lidamos.     

Ao tratar de interpretações de crises da democracia, tomamos a história tanto como objeto como abordagem. Trata-se de investigar momentos decisivos na constituição da democracia no Brasil; em primeiro lugar, a da busca da compreensão do chamado autoritarismo, o que era entendido então como esforço necessário para se poder enfrentar a ordem social e política criada pelo golpe. Esse esforço, realizado basicamente nos anos 1960 e 1970, abre caminho para uma nova ordem, cujo marco é a Constituição de 1988, fortemente questionada nos últimos anos. Estamos, portanto, numa posição privilegiada, a partir da qual, procuraremos explorar tanto as possibilidades como os limites da democracia no Brasil.

 Critérios de avaliação

Serão realizados seminários (30% da nota) e um trabalho final (70%) ao longo do curso. A nota final será resultado dessas atividades.