FURAO

ESTUDO DE CASO

BISCOITOS O FURÃO - 20 de março de 2015

            Esse caso descreve o desafio do micro e pequeno empresariado brasileiro e os diversos aspectos a serem gerenciados para a sobrevivência que misturam a vida profissional e a pessoal. Segundo o Sebrae a representatividade dessas organizações em número de postos de trabalho e quantidade é muito grande XXX, apesar em termos de faturamento e contribuição ao PIB ainda ser com baixa representatividade XXXX. Diferente do que acontece em países europeus YYY.

            Sr. Wilson XXX saiu de Miguelópolis aos 14 anos de idade e veio para Ribeirão Preto em busca de educação do ensino superior, no entanto a necessidade do trabalho fez com que ele não realizasse esse sonho. Quando chegou em Ribeirão Preto em 1973 o pai abriu uma oficina mecânica, assim começou a trabalhar com ele para ajudá-lo e também ter uma fonte de renda. No entanto o pai se afastou por motivos de saúde e ele precisou administrar a oficina sozinho, mas sem habilidade gerencial para controlar os fluxos financeiros, cuidar dos clientes e realizar o trabalho central, que era conserto e manutenção de veículos e motos. Assim a empresa foi à falência. (será que dentro dos moldes da lei brasileira de falência? Ou simplesmente fechou?)

            Mais tarde (data) o pai apresentou melhora no quadro de saúde, mas com algumas restrições para o ofício anterior, então resolveram abrir um negócio do fundo do quintal da casa e fundaram a fábrica de biscoitos O Furão. Em 1975? fundaram a fábrica com uma grande variedade de produtos, o canal de vendas era exclusivamente porta a porta, com visitas a 300 residências por semana. O quadro de funcionários era composto por 7 membros da família (pai, mãe, Wilson, duas irmãs e dois cunhados) e 7 funcionários. Naquela época os biscoitos eram vendidos a granel em padarias e mercearias, eles inovaram ao oferecerem produtos embalados em pacotes fechados.

            Em 1988 Wilson era majoritário, mas o fato da fábrica ser dentro de casa facilitou a ocorrência de problemas familiares, e picuinhas com cunhados fez com que ele saísse da empresa. Então começou a procurar emprego e uma semana depois estava empregado na Distribuidora de Bebidas Ribeirão Preto (Distribuidora da Antárctica), que possuia 200 funcionários. Ele entrou como vendedor reserva, mas em seguida a empresa foi comprado por outra de São Paulo(?), como os donos ficavam distantes atribuíram-lhe duas funções: de vendedor oficial e "fiscalizador/reportador”, para isso durante 3 meses ele trabalhou em todos departamentos. Dado sua dedicação foi promovido a Gerente de Transporte, e apesar de não ter curso superior Wilson fazia todos os cursos que lhe eram oferecidos: logística, manutenção preventiva.... (?quais outros?). Ficou nesta função durante 6 anos até ser promovido à Gerente de Vendas, onde ficou por 4 anos. Nessa unção dividia a área de atendimento com outro gerente, Sr. Wilson atendia bares e lanchonetes e o outro auto-serviço. Depois foi promovido novamente a Gerente Geral onde ficou pelos 2 últimos anos, até a venda da Antárctica para a Ambev (tendo em vista a sociedade da Distribuidora Ribeirão Preto com Antárctica).

            Durante o período de transição que durou 6 meses, somente Sr. Wilson sabia e não podia contar a ninguém para não influenciar o clima organizacional e expectativas dos funcionários. Sr. Wilson se sobrecarregou de tarefas além das tradicionais e sofreu muito pelo conhecimento da sua demissão em breve.

(ANO)            Um dos antigos colegas (?) demitido da Distribuidora, José Figueira, decidiu abrir uma Distribuidora de Gás GLP (cozinha) e o convidou para trabalhar com ele. Ele fez investimentos altos na empresa, comprou caminhões novos, inovou no processo de distribuição ao oferecer qualidade diferenciada no atendimento e manutenção nos fogões das residências clientes. A empresa começou a crescer e roubar participação de mercado das outras distribuidoras. Um dia Sr. Figueira foi convidado para uma reunião com as seis distribuidoras concorrentes e nessa foi ameaçado de morte caso não se enquadrasse nas regras de mercado e não abolisse o diferencial. Ele não era de Ribeirão Preto, ficou assustado com a situação e resolveu fechar a empresa e voltar para sua cidade. No entanto os empregados propuseram assumir o controle acionário e fizeram uma sociedade de 15 ex-empregados na forma jurídica de EPP (empresa de pequeno porte), pois como cooperativa precisariam de pelo menos 20 membros.

            Eles continuaram a inovar e lançaram o VALE-GÁS, que eram vendidos em supermercados, além das entregas residenciais. Após 2 anos de funcionamento as vendas deles estavam concentradas em poucos clientes (supermercados grandes) que passaram a não pagar corretamente. A inadimplência - ou seja, atraso no recebimento dos clientes e não recebimento - influenciou no fluxo de caixa e passaram a buscar recursos de terceiros para cobrir os compromissos. Essa situação resultou em alto endividamento e então resolveram vender a empresa em 2001, mas não receberam nenhum Real na venda, o comprador assumiu as dívidas e os créditos.

            Sr. Wilson resolveu realizar o antigo sonho no qual ele acreditava muito, tirar o Biscoito Furão do fundo do quintal e ter instalações apropriadas para a empresa. Conversou com a esposa e em dezembro de 2001 vendeu a casa, quitou a dívida restante da casa e decidiu investir na nova empresa que seria a fonte de renda da família. Em janeiro de 2002 começou a planejar, fez o Empretec do Sebrae e entrou em contato com Lázaro, que na época era contador da Distribuidora de Bebidas e que hoje tem uma empresa de contabilidade Audiplan. Ele o classifica como uma grande parceiro.

            Lázaro disse que o escritório poderia providenciar a abertura da empresa e isso teria um custo ou, ele poderia ir atrás dos documentos sozinho. Sr. Wilson preferiu a segunda opção e iniciou os contatos: (i) na Vigilância Sanitária conversou com Gil, alugou um imóvel e fez a reforma exatamente conforme as especificações. No entanto na hora da finalização foi identificado uma exigência que não tinha sido informada ao empreendedor; (ii) na Cetesb foi mais complicado porque não poderia ter forno a lenha, devido à liberação de gases/fumaça. Então precisou convidar o técnico para conhecer o procedimento, somente em junho de 2002 foi liberado; (iii) na abertura foi identificado que a antiga empresa de gás da qual era sócio tinha uma dívida junto ao INSS, ele procurou os colegas, mas como era de interesse individual, ele teve que pagar R$ 10.000 sozinho; (iv) a liberação junto ao Bombeiro foi tranquila; e (v) em março comprou 50 kg de polvilho de um antigo fornecedor do seu pai. Após a legalização começou a funcionar no dia 23 de julho de 2002.

            No início trabalhava sozinho na compra de polvilho e outros ingredientes, produção e venda. Mas logo no início teve a primeira grande perda, todo o polvilho comprado era de baixa qualidade e portanto o que era para render 100 gr, rendeu 50gr. Mais tarde notou a necessidade de contratar outra pessoa para ajudá-lo e durante três anos teve a ajuda de um rapaz que veio da Bahia para essa função. O bahiano trabalhava das 6hs às 14hs e Sr. Wilson das 6hs às 10hs, quando parava, trocava de roupa e saia para visitar os estabelecimentos e vender. As vendas não eram mais porta-a-porta, mas continuava com visitas semanais. O giro é rápido e o produto é barato, então tem que vender bastante. O prazo de recebimento de vendas era 1 semana, então quando voltava na outra semana para vender novos produtos, já recebia referente às vendas da semana passada.

            Em 2004 teve a crise do polvilho, a saca de 25 kg que custava R$ 17,00 foi para R$ 98,00 em 3 meses, e um ano depois caiu para R$ 35,00. Ele também credita parte do seu desempenho a um segundo parceiro, o fornecedor de polvilho de Taquaritinga. Para diminuir o impacto dessa crise, diminuiu o pacote de 100 gr para 80 gramas, e ainda assim repassou o aumento de preço para o varejo.

            Até o final de 2004 trabalhavam na empresa: Sr. Wilson, cunhado e o bahiano. Mas em dezembro de 2004, o bahiano teve um problema de saúde na família e precisou retornar para Bahia. Isso impactou fortemente no volume de produção, pois o processo é todo artesanal. Ele tem uma batedeira que faz o trabalho de bater a massa que é pesada, mas o pingamento da massa no formato de argola precisa ser feito individualmente. Em uma assadeira cabem 100 biscoitos, e o tempo de pingar é de 1 minuto para quem tem prática. Se tivesse um maquina o tempo se reduziria para 8 segundos.

            Em dezembro de 2004 iniciou-se a derrocada, junto com a saída do funcionário, o pai dele ficou doente e ele precisou dormir em uma cadeira no hospital com o pai durante 45 dias, e no dia seguinte trabalhar o dia todo. Com a saída do bahiano precisou reduzir produção, e o número de clientes atendidos por semana caiu de 110 para 60 clientes por semana. Ele estava muito cansado e exausto e convidou a filha Mariana, que trabalhava em um depósito de gás, para se juntar a ele. Ele a ensinou pingar a massa e ele nunca teve problema com demanda do produto, a produção foi reduzida exclusivamente por falta de capacidade da empresa.

            Em 2006(?) parou de pagar todos os tributos, inclusive INSS e deixou de pagar o contador, mas disse que quando as coisas melhorarem ele será o primeiro a ser remunerado. Mas identificou que tinha um problema de produção, então viu que precisaria mecanizar e foi ao Banco do Brasil tentar um PROGER[1] (Programas de Geração de Emprego e Renda). O gerente Antônio o entregou os documentos com as informações necessárias para elaboração de projeto, os dados solicitados eram de 5 anos e a forma de pagamento seria 1 ano de carência do principal, pagando somente juros e depois 5 anos de amortização do principal com juros. Mas ele achou muita informação solicitada, mas depois que consegui juntar as informações levou de volta ao gerente, mas Antônio tinha sido transferido para Araraquara. Para se tornar elegível precisaria estar com tributos em dia e ele estava com INSS pendente. Então pegou um empréstimo no banco para quitar o INSS e assim conseguir acessar o PROGER. Mas não conseguiu aprovação deste financiamento, assim deixou de pagar o financiamento do INSS. A dívida inicial era de R$ 3.500, no final de 2014 a dívida estava em R$ 23.500, mas ele se negou a pagar porque não era isso que estava devendo. Todos os dias entre 18 e 19 hs o serviço de cobrança terceirizado do banco ligava na empresa para cobrar, ele dizia que reconhecia a dívida, mas que não tinha condições de pagar. Não tem casa própria, o carro velho que utiliza é do cunhado. Após várias negociações, assumiu o compromisso da dívida e a quitou por R$ 5.000.

            Sr. Wilson diz que o empreendedor tem que ser perseverante. A margem era muito boa, vendia por R$ 1,00 e ganhava R$ 0,80, portanto era uma baixa margem unitária em valor nominal, mas 80%, portanto para que essa margem se convertesse em retorno alto, teria que ter um giro.

            Em 2010, abriu uma Distibuidora MEI para filha Mariana, pois um dos clientes o Cenourão queria pagar somente com boleto. Ele ainda é ME microempresário e para isso se enquadrou no Simples Nacional e além do ICMS convencional tem 5,85% da base de cálculo do ICMS, que parte é paga pelo cliente (varejo), que terá o crédito quando da venda para consumidor final.

            Em dezembro de 2013 teve outra crise do polvilho, as pessoas que produziam mandioca deixaram de plantar pelo baixo preço. Ele tinha um parceiro de ponta de polvilho em Taquaritinga, apesar dos pólos de produção serem Paraná, Minas Gerais e Goiás. O fornecedor avisou antecipadamente que a saca de 25 kg estava R$ 50,00 e chegaria a R$ 120,00 dali três meses. Então ele antecipou a compra de polvilho que dariam para os próximos 9 meses de produção. A forma de pagamento foram em 5 parcelas. No final de 2014 voltaram a ter polvilho ruim, a cor estava mais clara, bem branca, mas azedo porque estavam fermentando com tampa fechada e Sr. Wilson alertou que esse poderia ser o problema. Com a qualidade azeda do polvilho começou a perder clientes, mas logo se reestabeleceu com o descobrimento da causa do fornecedor. A temperatura do ambiente influencia a qualidade do biscoito, então dias úmidos o polvilho não cresce tanto, fica mais denso e menor.

            Em 2012 ele havia tentado a aposentadoria, mas não tinha conseguido porque o INSS tinha ficado um período sem pagar e não poderia pagar 6 anos em uma única vez. Ele foi 22 vezes ao INSS para verificar o que precisaria fazer. Como tinha recebido um dinheiro do cunhado por tê-lo ajudado em um processo, utilizou parte dele para pagar os anos atrasados. Mas depois veio a negativa do INSS que a empresa dele não existia, como poderia ter recolhido sobre pro-labore de um empresa inexistente? Pois não recolhia os impostos sobre vendas há 7 anos, apesar de sempre ter emitido notas fiscais dos produtos vendidos. Então em janeiro de 2015 o contador Lázaro o enquadrou no REFIS para pagamento dos débitos tributários pendentes, com isso tem uma obrigação de R$ 600,00 mensais.

            Sr. Wilson utiliza uma planilha muito boa de custos fornecida pelo Sebrae na época. Ele aumentou o preço 120% após a última crise do polvilho, e reduziu as embalagens novamente ficando com uma variedade de 80g, 60g e 40g.

            O Biscoitos Furão perdeu os 2 revendedores mais importantes, esses representavam boa parte das vendas. O motivo foi que Sr. Wilson não quis abaixar o preço para nivelar com concorrência, por isso alerta para não ter concentração de clientes. E com isso vem se arrastando por 13 anos com o seguinte lema "Resisto, Persisto, mas não Desisto”! Ele não quer ser uma grande empresa, mas acredita muito naquilo que faz.

            Ele tem trabalhado de 12 a 15 horas por dia em pé, em temperatura de 30-40 graus Celsius devido ao forno, e com as contas mensais que tem a pagar passou a trabalhar também aos domingos.

            Em janeiro de 2015 foi ao Banco do Povo para buscar recursos para terminar de construir uma pingadeira que iniciou há 6 anos.

biscoitosfurao@yahoo.com.br



[1] "Os Programas de Geração de Emprego e Renda do FAT - PROGER, compõem-se de um conjunto de linhas de crédito disponíveis para interessados em investir no crescimento ou modernização de seu negócio ou obter recursos para o custeio de sua atividade. Enfatizam o apoio a setores intensivos em mão-de-obra e prioritários das políticas governamentais de desenvolvimento, além dos programas destinados a atender necessidades de investimento em setores específicos, objetivando aumentar a oferta de postos de trabalho e a geração e manutenção da renda do trabalhador. O PROGER destaca-se pelo estímulo ao desenvolvimento em infra-estrutura que propicie aumento da competitividade do País, às exportações e à participação ativa na democratização do crédito produtivo popular, promovendo melhorias nas condições de vida dos trabalhadores, especialmente os de baixa renda” MTE, 2014.