Historiadores e atores políticos: a historiografia
paraguaia na era liberal (1904-1936)
Luiz Felipe Viel Moreira
Resumo
Com a revolução de 1904, iniciou-se no Paraguai uma nova etapa da vida política. O programa revolucionário vencedor baseava-se na própria Constituição liberal de 1870, que até então se constituíra em letra morta. Assim, começava a chamada “era liberal”, período em que houve o domínio político do Partido Liberal e a oposição do Partido Colorado, e que se estendeu até 1936. Neste ano, um golpe militar de um exército confiante das recentes vitórias obtidas na Guerra do Chaco, era a resposta quase natural aos apelos dos modelos autoritários europeus que ganhavam corpo em núcleos castrenses importantes. Na “era liberal”, o surgimento de grande figuras intelectuais do porte de Cecilio Báez, Manuel Gondra, Blas Garay, Manuel Dominguez, Eligio Ayala, Juan O’Leary e tantos outros, foi marcado pela particularidade de serem normalmente os mesmos, também atores políticos importantes. Assim, a História paraguaia foi caracterizada por um debate eminentemente partidário, com resquícios até os dias de hoje. Buscar-se-á aqui, traçar o percurso da produção historiográfica deste período, percurso esse que tem como um de seus temas divisores, um posicionamento frente aos sucessos da Guerra da Tríplice Aliança e da figura do Marechal López.
A
Constituição Liberal
A Grande
Guerra ao terminar em 1870 devastou o Paraguay: de 1.300.000 habitantes
sobreviveram 300.000, a maioria mulheres e crianças. A nova constituição, de
caráter liberal, foi jurada em 25.11.1870. A vida política ao longo da década de
1870 foi uma sucessão de golpes de Estado e revoluções. Em 1880 o General
Bernardino Caballero (1839-1912), um dos grandes comandantes da guerra, se fez
designar presidente provisório, governando de 1880 a 1886, e influindo
decisivamente na vida política do Paraguay até os
primeiros anos do século XX, quando a revolução de 1904 deslocou o eixo de
poder. Os desdobramentos da revolução de 1904 encerram o ciclo de governantes
militares, uma geração que havia lutado na guerra, mas que se dividiu nestas
três décadas na preferência pelas influências sempre permanentes da diplomacia
brasileira ou argentina.
Em 1887
um novo tratado voltou a conceder importantes porções do Chaco para a Bolívia,
com ampla saída sobre o rio Paraguay. Isto precipitou
a organização/reestruturação da vida política no Paraguay, com a oposição ao oficialismo organizando-se em um partido político, o Centro Democrático. Este teve seu nome
logo substituído pelo de Partido Liberal, contando em seus quadros também com militares, sendo
um de seus líderes o General Benigno Ferreira. No mesmo ano, a agrupação que
representava o oficialismo organizou a Associação Nacional Republicana, conhecido popularmente
como Partido Colorado, sob a presidência do General Bernardino Caballero. A trajetória de ambos partidos, com todas suas divisões internas,
permeiam a política paraguaia até o tempo presente.
Na vida
cultural de então, foi fundamental o surgimento em 1896 do Instituto Paraguayo, e que se transformou no centro intelectual de
Asunción – centro que contou com a publicação de uma
revista de mesmo nome. Foi ali que participaram em debates grandes figuras como
Cecílio Báez, Manuel Gondra,
Manuel Domínguez, Blas Garay, Juan Silvano Godoi, Fulgencio R. Moreno, Juan E.
O’Leary. Simpatizantes ou militantes dos partidos
Colorado ou Liberal, era toda uma nova geração, nascida durante a guerra da
Tríplice Aliança - o mais velho era Cecílio Báez,
nascido em 1862.
Esta foi
a chamada “geração de 900”, toda ela educada no Colégio
Nacional de Asunción. Na impregnação de valores
modernos pelo qual passava a cultura paraguaia, um dos eixos principais era dado
pelo positivismo, particularmente em sua versão spenceriana, que privilegiava o critério evolucionista na
análise das sociedades. Esta geração exerceu uma influência parecida a que
correspondeu a de 1880 na Argentina. Nos domínios da organização institucional,
renovaram os quadros dirigentes dos Partidos Colorado e
Liberal, passando a exercerem postos em todas as instâncias da vida
política local, tendo também todos atuado no jornalismo – local onde se davam os
debates.
Para
1900, o censo registrava já uma população de 635.571 pessoas, duplicando-se os
habitantes do Paraguay após três décadas de terminada
a guerra. No horizonte, frente ao domínio político do Partido Colorado,
levantava-se o Partido Liberal com suas bandeiras: as duas maiores
reivindicações doutrinárias seriam o entendimento do individualismo como motor
da sociedade política, em vez de gregarismo tradicional, visto como anacrônico
aos tempos “modernos”, e a autocrítica, como fator do processo democrático, em
vez do autoritarismo caudilhista imputado como prática
exclusiva dos colorados.
A era
liberal (1904-36)
Revolução
Liberal de agosto de 1904 representou a união dos diversos setores do
liberalismo com o grupo colorado do General Egusquiza,
de inclinações argentinistas. O programa
revolucionário era a constituição liberal de 1870, até então letra um pouco
morta. No mesmo ano, o Pacto de Pilcomayo colocou fim
às hostilidades: os colorados conservavam algumas ministérios, mas terminava seu
predomínio, começando o que se convencionou chamar da era
liberal.
Já para o
final da década, aumentava a tensão com a Bolívia pelo tema do Chaco. A região
manteve o status quo de área em conflito,
submetendo-se a uma arbitragem da Argentina e dos EUA. A partir de então, os
temas que norteariam a vida pública paraguaia passavam paulatinamente a estarem
vinculados a duas guerras, uma que iria em breve se comemorar o cinqüentenário
de seu término, e outra que se avizinhava.
A esta
geração de 900 não apenas correspondeu uma atuação política, mas também a
construção e reconstrução da memória coletiva no campo da historiografia. Os
dois grandes motivos para isto davam os acontecimentos da época: a campanha de
revisionismo histórico iniciada na década de 1910/1920, que
colocou em discussão o drama da Guerra da Tríplice Aliança, cuja conseqüência
foi o renascimento do nacionalismo e o interesse popular para com o
passado; e a necessidade de rebater os argumentos históricos de direitos que
Bolívia reivindicava sobre o Chaco. Para ambos os temas,
nenhum destes intelectuais deixou de se manifestar de alguma forma, sendo
que para o cinqüentenário do fim da chamada “Guerra Grande”, abundaram
publicações principalmente de autores vinculados ao Partido Colorado. Era a
reivindicação Lopista, com todas suas implicações
anti-liberais e
anti-democráticas.
Ao final
da década de 1910, a nova lei eleitoral, sobre a base do voto secreto e o
registro permanente, permitiu aos colorados retornarem ao parlamento sem
necessidade de pactos. Entretanto isto não foi suficiente, pois não havia se
alterado a fórmula de composição dos partidos no Congresso –
o que garantia ao principal 75% das cadeiras. Assim em 1926, com todo um
clima emocional quando das comemorações centenário do nascimento do Marechal
Lopez, a permanente abstenção eleitoral do Partido Colorado estava desembocando
em aberto anti-parlamentarismo. A redação da nova lei
eleitoral, deixada a cargo dos Colorados foi estratégica aos Liberais, pois
possibilitou arregimentar a volta da participação política da agremiação
colorada nos comícios, bem como a cargos nas várias esferas do
governo.
Com as
celebrações para o Marechal Lopez, a polêmica na imprensa aumentou de tom,
principalmente entre O’Leary e Justo Pastor Benitez, os principais ideólogos orgânicos
respectivamente dos partidos Colorado e Liberal. Em agosto de 1926, a
discussão no Congresso passava a se dar em torno da anulação do famoso decreto
de 17.08.1869, que qualificava a Solano Lopez de “Assassino de sua Patria”. O movimento alcançava mesmo um âmbito mais amplo
que o das elites políticas. Os moradores do popular bairro de Tuyuená chegaram a pedir a mudança do nome do bairro para
Marechal Lopez.
A crise
mundial de 1929 repercutiu na economia sem transtorná-la, que seguia dependente
das exportações de erva-mate, tanino, tabaco e quebracho. Mas desde 1930, começou a decompor-se o ambiente
político, devido ao agravamento e paulatina deterioração das relações com a
Bolívia.
A guerra
do Chaco (1932-35) foi ganha sob o regime da democracia liberal instituída pela
constituição de 1870. Mas paradoxalmente, em vez de fortificá-la, precipitou sua
derrocada. Desde antes do conflito, os modelos autoritários europeus eram
apresentados como fórmulas para os males que sofria o país. Estas idéias
ganharam corpo em núcleos importantes do exército, formados principalmente
durante a década de 1920 na Alemanha e no Chile, que se acreditaram habilitados
a substituir os partidos tradicionais na condução do país. Nem o prestígio ganho
pelo presidente civil pelo desenlace da guerra, nem pelo Comandante General
Estigarribia, puderam evitar um pronunciamento
militar.
Em
17.02.1936 um golpe militar desalojou o Partido Liberal do governo, jogou os
arquitetos da vitória na cadeia e logo ao exílio, e levou ao poder ao Cel.
Rafael Franco – um dos heróis da recente contenda. A chamada Revolução
Libertadora anulou a constituição de 1870 (decreto no 152 de
10.03.1936), revestindo-se da mesma índole das transformações sociais
totalitárias da Europa. O decreto identificava fascismo e Estado Paraguaio,
sendo respaldado por um amplo leque político: de colorados a setores liberais,
passando pelas agrupações menores, inclusive o apoio do Partido
Comunista.
O golpe de 1936 abriu toda uma nova etapa na vida política paraguaia, retomando o que Guido Alcalá Rodrigues chama da tradição autoritária: Franco – Estigarribia – Morínego – Chaves – Stroessner.
Historiadores
e atores políticos: a historiografia paraguaia na era liberal
(1904-1936)
A construção e reconstrução da memória coletiva no campo da historiografia para a época, esteve a cargo da chamada “geração de 900”. Seus principais representantes foram:
Cecilio Báez (1862-1941):
Doutrinário do liberalismo, foi um crítico dos métodos de governo dos López. em
“La tiranía en el Paraguay (1903)”. Já em “Ensayo sobre el doctor Francia y la dictadura en Sudamérica (1910)”, se mostrava mais benevolente. Tem-se que
lembrar que Comte, seu mestre, tinha a Francia como um de seus santos laicos – e
de muitos positivistas paraguaios. Ademais de sua polêmica com Juan E. O’Leary sobre o Marechal López na década de 1920, manteve a
controvertida posição de responsabilizar o “cretinismo” do povo paraguaio pela
aceitação das tiranias do passado. Foi Presidente da República e reitor da
Universidade por muitos anos.
Manuel
Gondra (1871-1927):
Presidente da República durante a era liberal, é considerado por parte da
historiografia paraguaia como a mais alta expressão da intelectualidade
paraguaia nas primeiras décadas do século XX – tendo o próprio Rubén Dario dele
falado com admiração. Seus
escritos, quase todos anteriores a 1904, foram recompilados em “Hombres y
letrados de América (1942)”. O autor critica a Francia e López por haver
governado em forma absoluta.
Blas Garay (1873-1899): Apesar de militante e ideólogo orgânico colorado, pouco antes de sua prematura morte, sustentou o fracasso desse partido, bem como do Liberal. Reclamava a criação de um novo partido de caráter socialista e autoritário, mais conforme com os antecedentes históricos e a organização social do país. Assim o reflete “El comunismo en las Misiones (1897)”. Escreveu também “Compendio elemental del Paraguay (1896)” – a primeira história escrita por um paraguaio desde Ruy Díaz de Guzmán. Por decreto de 03.03.1896 foi nomeado Encargado de Negocios en Madrid y Secretario de la Legación em Paris e Londres – deveria buscar documentos sobre os limites ocidentais nos arquivos europeus.
Manuel
Domínguez (1868-1935):
Colorado. Chanceler, 1902; Vice-Presidente, 1902-1904; revoltoso em 1904;
Ministro da Justiça em 1911. Seus principais trabalhos estão reunidos em “La
traición a la patria (1899)” e “Alma de la Raza (1918)”. Ao tratar dos direitos sobre o Chaco,
sustentava ser o Paraguay superior aos demais países
americanos. As causas da supremacia seriam raciais – Taine, Le Bom e Gobineau são citações correntes. O Paraguay seria o resultado da união da melhor raça européia
com a corrente da melhor raça da América, dando origem a uma raça guerreira.
Fulgencio Moreno
(1872-1933):
Colorado. Ministro da Fazenda, 1901-03; Chanceler,1912 Plenipotenciário nas
principais negociações com a Bolívia e colaborador permanente de “La Prensa” de
Buenos Aires, com seus artigos sendo recompilados em “La ciudad de Asunción (1926)”.
Publicou também “Estudio sobre la independencia del Paraguay (1911)” – demonstra o arriscado que era atribuir a
uma pessoa (Francia) a criação da nacionalidade e da independência.
Eligio Ayala (1879-1930):
Intelectual do Parido Liberal, foi Deputado. Ministro da Fazenda, 1919 e
1928-30; Presidente, 1923 e 24-28. Vai para a Europa em 1911, morando por lá
nove anos. Escreveu “Migraciones (1915)”, bem como “La
cuestion social (1918)”. Conhecia as mais modernas
doutrinas financeiras, e em seu governo finalmente o Paraguay logrou uma estabilidade monetária, aplicando
contraditoriamente medidas distante da ortodoxia econômica liberal, com o Estado
passando a intervir e dirigir a economia. Pela primeira vez em muitos anos houve
superávit no pressuposto, que foi aplicado principalmente na aquisição de
armamentos devido ao rumo que estava tomando a questão do Chaco com a Bolívia.
Eusebio Ayala (1875-1942): Sem
nenhum parentesco com Eligio, mas que como ele se
formou na Europa e versado em finanças, em economia, em pedagogia e psicologia –
foi discípulo de Bergson. Liberal, governou o Paraguay em dois momentos críticos, 1921 e 1932. Nos livros
“Ante el país (1932)” e “Patria y libertad”, publicado
apenas em 1952, contêm seus escritos relacionados com o conflito no Chaco.
Juan
E. O’Leary (1879-1965).
O chamado de Gondra (“aceptemos el pasado íntegro de la patria, con sus glorias
y crímenes, ya que nuestro tirano fue el único de América que murió con el
nombre de patria en los labios”) facilitou sua tarefa em todos os meios políticos, inclusive no do
liberalismo. Ideólogo
orgânico do Partido Colorado, se dedicou a glorificação
do Marechal López. Em “El Mariscal López (1920)”,
O’Leary inicia um movimento de reivindicação do
marechal López, e dos heróis do passado. Sua produção foi imensa. Pertence
cronologicamente a etapa de predomínio liberal no Paraguay, mas é um dos iniciadores da revolta contra essa
ideologia política. Seu livro “Apostolado Patriótico (1930)”, marcado pela
influência do pensamento de direita francês, com seu peculiar culto irracional
das grandes figuras do passado militar, pretende ser uma revisão da história do
Paraguay. Ao professar um “nacionalismo integral”,
O’Leary se declara discípulo de Maurras. O’Leary sempre viveu como
funcionário público, e isso limitava sua prédica anti-liberal. A partir de 1936 O’Leary se torna mais explícito, sendo o iniciador de uma
corrente que quer ver em Francia e López os representantes de uma tendência
socialista e enfrentada aos interesses de uma oligarquia
local.
Historiadores
e atores políticos: a geração que segue a de “900”
A geração
que segue a de “900”, foi a de homens que nasceram entre o final do século XIX e
o início da década de 1920. Muitos de seus membros foram contemporâneos da
geração anterior no debate intelectual, sendo também responsáveis pela
construção e reconstrução da memória coletiva no campo da historiografia. Entre
seus representantes temos a Justo Pastor Benítez e
Justo Jose Prieto. Neste grupo se encontra também
Natalicio Gonzáles, com sua prosa se batendo contra os
pressupostos ideológicos do passado imediato (o positivismo liberal). Este autor
comparte as preocupações latino-americanas que produziram reflexões filosóficas
fundamentais sobre a própria realidade (Ezequiel Martínez Estrada, Mariáteghi,
Haya de la Torre, German Arcineagas, Leopoldo Zea). Todos eles se encontram consideravelmente afastados
tanto do liberalismo ortodoxo como do positivismo. São idealistas, marxistas,
anti-imperialistas ... e alguns mais outros menos,
nacionalistas continentais.
Para o período que segue a 1936, emigrou grande parte da intelectualidade paraguaia, exilando-se principalmente em Buenos Aires. De todos os velhos guias intelectuais, só ficou em pé Juan E. O’Leary, silenciado com a sombra do monumento que Stroessner mandou construir em sua honra – era a consagração de sua campanha de reivindicação lopizta. Mas sua obra não teve continuação, e os novos historiadores iniciam a tarefa de questionamento dos mitos.
Os
nacionalistas de direita coincidem parcialmente com a esquerda, já que para eles
Francia e López ao impor um sistema autoritário e antiliberal, se converteram
nos representantes da alma nacional do “Paraguay
Eterno”, na expressão de Natalício González. Entre os
ideólogos do nacionalismo colorado, correspondeu um papel importante a Juan
O’Leary e a Natalício González. Ideologia conservadora
que serviu maravilhosamente bem aos grupos que detiveram o poder após a queda de
Morínigo em 1948 – o governo Stroessner fez a reedição
completa das obras de O’Leary.
Cabe
lembrar que ainda fazem parte desta geração que segue a de “900”, o historiador liberal Efraím Cardozo (1906-1975) e o escritor Augusto Roa Bastos
(1917), mas ambos com uma produção que se desenvolveu principalmente na segunda
metade do século.
Natalicio González (1897-1966): Doutrinário do antiliberalismo e ideólogo orgânico do Partido Colorado, a quem se deve a conversão do lopizmo em teoria política: “Solano López y otros ensayos (1926)”. Discípulo de O’Leary, foi apologista da tradição autoritária e bélica. A difusão do lopizmo e do culto dos heróis em geral, coincide com a difusão das idéias fascistas no Paraguay da década de 30/40. Com “El Paraguayo eterno (1935)”, iniciou sua tarefa de ataque ao regime instituído pela constituição de 1870, e de esboço de um socialismo de Estado inspirado nos modelos do século XIX. Foi Presidente da República após a queda de Morínego, 1948/49. Em “O Paraguay Eterno”, utilizando a distinção entre o país real e o país legal, tratou de demonstrar que o liberalismo no Paraguay representava o exótico frente a legítima tradição autóctone – desenvolvida esta a partir da chegada dos conquistadores e missionários espanhóis. Outro dos temas difundidos, que adquiriu conotações fortemente antiliberais na época é o do “legionarismo”. Natalício González, como anteriormente Manuel Dominguez e O’Leary, identificou e atacou o perigoso organismo externo, o inimigo da nacionalidade, nos membros da Legião Paraguaia que haviam combatido na guerra terminada em 1870. Os inimigos da nação foram identificados com os liberais, e como traidores da raça que eram, depois de haverem vendido a Lopez, entregavam agora o Chaco aos bolivianos. Exilado no México onde veio a morrer, desenvolveu enorme produção literária, vindo em 1956 a se tornar ali embaixador. “El Paraguay Eterno” não é claro, já que para o autor o Paraguay começou com a chegada dos europeus. Entretanto, a compreensão vem no contexto da busca das chamadas “essências” nacionais que tiveram lugar na América Latina da década de 1930 – paraguaydad, mexicanidad, argentinidad, etc. O fator história é apresentado pelo autor em forma particular: como conseqüência da conquista e evangelização, desenvolveu-se no Paraguay uma mentalidade antiindividualista, antiliberal e tendente ao socialismo de Estado. Tomando em conta estes traços essenciais da alma nacional, o Dr. Francia e os López estabeleceram governos autoritários que satisfaziam as expectativas locais, além de manterem o país a salvo da anarquia e da exploração imperialista. Assim, a imposição da constituição liberal de 1870, devido a vitória aliada na guerra teria obrigado o Paraguay a abandonar a forma de governo própria de sua essência – a ditadura. Desta forma González pretende haver explicado em que consiste a essência nacional, recorrendo à tríade terra, raça e história.
Justo
Jose Prieto (1897-1982):
Considerado o continuador de Cecilio Báez, foi expositor e
defensor da doutrina liberal clássica. Foi um acadêmico e político do Partido
Liberal. Com trabalhos no início da década de 1930, aborda em “Paraguay, la Provincia Gigante de las Indias (1951)” a interpretação liberal da história paraguaya – a
mesma revalorização do liberalismo nativo, subjugado pelos
despotismos anteriores a 1870.
Justo
Pastor Benítez (1895-1963):
Jornalista e político liberal, foi por diversas vezes Ministro de Estado –
Chanceler durante o período da guerra do Chaco. Foi a
figura mais brilhante da intelectualidade paraguaya de
pós-guerra. Em 1920, quando da comemoração do cinqüentenário de Cerro Corá,
Benitez aderia ao lopizmo de
O’Leary, atitude que não voltaria atrás, mesmo
diferenciando-se da maioria das figuras de seu partido. Sua principal obra é
“Formación social del pueblo
paraguayo (1955)”, onde o protagonista não é a
sociedade, senão o homem paraguayo em simbiose com seu
meio cultural.