11. Especializações de membrana

Um último aspecto importante a ser abordado em relação à MP refere-se às chamadas especializações da membrana, regiões que sofrem determinadas modificações para a execução de funções específicas, como as de uma maior atividade de absorção de substâncias, aderência e comunicação intercelulares.

As microvilosidades constituem, talvez, uma das especializa­ções mais conhecidas (Fig. 15). Na forma de prolongamentos digitiformes da MP apical, são geralmente observadas em células epiteliais cuja função principal está voltada para a absorção. Um exemplo típico é encontrado nas células do epitélio intestinal (enterócitos), onde a presença de até 3.000 microvilosidades por célula leva a um aumento considerável em seu potencial de absorção de metabólitos a partir da luz do intestino envolvendo proteínas transportadoras. O aumento de superfície de membrana também implica num incremento de outras proteínas funcionais da membrana, como, por exemplo, de enzimas de digestão terminal no caso dos enterócitos.

Por outro lado, as células de um tecido estabelecem, ao longo de suas membranas uma série de especializações denominadas junções intercelulares, que mediam funções extremamente importantes, como as da adesão e comunicação entre células adjacentes.

Micrografia eletrônica de uma célula intestinal mostrando a membrana plasmática apical modificada na forma de microvilosidade
Figura 15: Micrografia eletrônica de uma célula intestinal mostrando a membrana plasmática apical modificada na forma de microvilosidade.

Fonte: Original

Nas células epiteliais, onde são mais evidentes, são reconhecidos quatro tipos principais de junções intercelulares nas MPs laterais de células vizinhas (Fig. 16). Temos, inicialmente, as zônulas de oclusão, que na forma de cintas selantes contínuas em torno do ápice das células, obliteram os espaços intercelulares, impedindo, conseqüentemente, a passagem de fluidos através de epitélios, criando barreiras de permeabilidade. Um exemplo típico é encontrado no tecido epitelial que reveste a bexiga urinária do homem. A presença de zônulas de oclusão entre as células, impedem que a urina passe através dos espaços intercelulares, ficando contida no interior do órgão.

Estas junções criam assim barreiras de permeabilidade através de epitélios. As zônulas de adesão e os desmossomos proporcionam sítios de ancora­gem de elementos do citoesqueleto e mantêm, além disso, a coesão intercelular. Enquanto que as primeiras formam uma cinta contínua em torno da membrana lateral da célula, os desmossomos são focais, restritos a pequenas regiões da membrana lateral mas, como no primeiro caso, em íntima associação com estruturas semelhantes da célula vizinha. Os desmossomos são os principais pontos de adesão entre as células de um tecido.

Os diferentes tipos de junções intercelulares

Figura 16: Os diferentes tipos de junções intercelulares.

Fonte: composição: KARP, G. - Cell molecular biology. New York, J. Wiley, 1996. ALBERTS, B.; JOHNSON, A.; LEWIS, J.; RAFF, M.; ROBERTS, K. & WALTER, P. - Molecular Biology of the Cell. 5th Edition, New York, Garland, 2008.

Você está lembrado do questionamento inicial da presente aula: a organização celular têm alguma relação direta com o cotidiano do aluno? Nesse momento demos o exemplo da doença “fogo selvagem”. Agora vamos a explicação sobre as causas celulares de tal doença: ela é provocada pela formação de anticorpos contra uma proteína constituinte dos desmossomos do tecido epitelial que forma a pele. De causa desconhecida, provoca uma perda de aderência entre as células, permitindo a passagem de líquido tissular entre elas, ocasionado a formação de bolhas (Fig. 17). Além do incômodo para o paciente, estas bolhas podem se romper e permitir a penetração de agentes infecciosos.

Além dos desmossomos, existem, ainda, os hemidesmossomos, junções semelhantes às primeiras, mas que se localizam na MP basal e ligam às células à lâmina basal, estrutura laminar onde se assenta o epitélio.Finalmente, temos as chamadas junções comunicantes, com funções bem diferentes das anteriores. Apresentam-se como conjuntos de canais hidrofílicos formados por proteínas integrantes de membrana (semelhantes às proteínas de canal da MP) localizados entre células adjacentes.

Assim, os canais de uma célula estão em contato direto com canais semelhantes da célula vizinha, permitindo a passagem de pequenas moléculas e íons entre elas. Deste modo, as junções comunicantes possibilitam o funcionamento coordenado das células de um tecido através da troca de metabolitos, íons e moléculas sinalizadoras, como o AMP cíclico. O movimento sincrônico das fibras musculares cardíacas durante os batimentos do coração é devido, por exemplo, à presença de inúmeras junções comunicantes nas membranas plasmáticas dessas células.

Paciente portador de pênfigo vulgar (ou fogo selvagem), mostrando detalhes das lesões na pele
Figura 17: Paciente portador de pênfigo vulgar (ou fogo selvagem), mostrando detalhes das lesões na pele.

Fonte: site: http://www.poderdasmaos.com/site/?c=00132&id=4452&letra=P&PENFIGO acessado em 09/09/2010.

Por fim, a MP basal de alguns tipos celulares forma uma série de invaginações a intervalos regulares que levam, analogamente às microvilosidades, a um aumento considerável de sua superfície (Fig. 18). Estas invaginações da MP basal, encontradas, por exemplo, nas células dos túbulos renais de mamíferos, estão geralmente relacionadas ao transporte de íons e água através da membrana. Como a demanda de energia neste transporte é alta, a presença de mitocôndrias - que produzem a maior parte do ATP utilizado pela célula - associadas a essas invaginações (assim como no citoplasma próximo à base das microvilosidades) é, geralmente, muito grande.

Invaginações da membrana plasmática basal associadas a mitocôndrias
Figura 18: Invaginações da membrana plasmática basal associadas a mitocôndrias. Este arranjo aumenta a superfície de transporte ativo, principalmente de água e íons, entre a célula e o meio.

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